DARA CIGANA

30/12/2015

UM ANO NOVO QUE SE INICIA

2016 SERÁ UM ANO ONDE A RESPONSABILIDADE E GRANDES DECISÕES DEVEM SER PRIORIDADE O ANO SERÁ REGIDO PELO GRANDE ASTRO SOL,QUE DEIXARÁ TUDO SEMPRE AS CLARAS E TODOS OS FEITOS SERÃO RESSALTADOS. OS ORIXÁS QUE ESTARÃO ATUANDO SERÃO YEMANJÁ E OXALA QUE VEM TRAZENDO A RAZÃO E TRANQUILIDADE.

09/09/2012

SOBRE A ORIGEM DO POVO CIGANO MITOS,HIPÓTESES E EVIDÊNCIAS

Mitos, Hipóteses e Evidências Sobre a orígem dos povos A verdadeira orígem dos Ciganos (Rom e Sintos) Muitos mitos tem sido elaborados sobre a orígem desse misterioso povo presente em todas as nações do ocidente, chamado de maneiras diferentes, comumente conhecidos como gitanos, ciganos, zíngaros, etc., cujo nome verdadeiro é Rom (ou melhor, Rhom) para a maioria dos grupos e Sintos para os demais. Não exporemos aqui as lendas universalmente reconhecidas como tais, a não ser o último mito mais largamente difundido que ainda é considerado como verdade: a presumida orígem indo-européia. O fato de que o povo rom chegou à Europa proveniente de algum lugar da India não significa que tenham vindo de sua terra de orígem. Todos viemos de algum lugar onde nossos ancestrais viveram, quiçá tendo chegado eles mesmos de algum outro país. Toda a hipótese que sustenta a orígem indo-européia se apóia num único elemento: o idioma romanês. Tal teoria não leva em conta outros fatores culturais muito mais importantes que evidenciam claramente que o povo rom não tem nada em comum com as gentes da India, exceto elementos linguísticos. Se devêssemos levar a sério uma hipótese que se baseia sómente no idioma para determinar a orígem do povo, chegaríamos à conclusão de que quase todos os norte-africanos vieram da Arábia, que os judeus ashkenazim são uma tribo germânica, que os judeus sefaraditas são simplesmente espanhóis que praticam outra religião e não que são um povo diferente, etc. Os afro-americanos não sabem sequer que idioma falavam seus ancestrais e portanto deveriam considerar-se ingleses. Definitivamente, o idioma por si mesmo não é suficiente para definir a pertinência étnica, e todos os demais fatores determinantes são contrários à idéia de uma orígem indiana do povo rom - incluindo alguns elementos presentes no próprio idioma romaní. Os fatores mais importantes que permanecem em todo povo desde a mais remota antiguidade são de consistência espiritual, que se manifestam nos sentimentos mais íntimos, comportamentos típicos, memória coletiva, quer dizer, na herança atávica. Neste estudo, começarei expondo o mito antes de apresentar as evidências e a consequente hipótese sobre a verdadeira orígem do povo rom. Os estudiosos fizeram muitos esforços com o propósito de demonstrar a orígem indiana do povo rom, todos os quais foram inúteis por falta de evidências. Alguns documentos que foram inicialmente considerados como referentes ao povo rom, como por exemplo os escritos de Firdawsi, tem sido sucessivamente desacreditados. Demonstrou-se que todos os povos dos quais se pensou que poderiam ter alguma relação com os ciganos, como os dom, os luris, os gaduliya lohars, os lambadis, os banjaras, etc, na realidade não tem sequer uma orígem comum com o povo rom. A única semelhança entre todos eles é a tendência à vida nômade e o exercício de profissões que são típicas de toda tribo de qualquer extração étnica que pratica tal estilo de vida. Todos estes resultados inúteis são a consequência natural de uma investigação realizada a partir de parâmetros errados, ignorando a essência da cultura romaní e a herança espiritual do povo cigano, que é incompatível com qualquer povo da India. Uma teoria que recentemente está obtendo sucesso no ambiente intelectual interessado no argumento (teoria destinada a provar-se errônea como todas as precedentes) pretende ter descoberto a "cidade" original na qual o povo rom poderia ter suas orígens: Kannauj, em Uttar Pradesh, India. O autor chegou a algumas conclusões interessantes que desacreditam todas as precedentes, sem dúvida seguiu a mesma linha investigativa que produziu o fracasso daquelas outras: o indício linguístico, que o conduz indefectivelmente a obter um resultado errado. Por conseguinte, o autor funda sua hipótese inteiramente sobre uma suposta evidência linguística, a qual é absolutamente insuficiente para explicar os aspectos culturais do povo rom que não estão relacionados com o idioma e que indubitavelmente são muito mais importantes, aspectos que constrastam com a teoria proposta. Neste estudo citarei algumas afirmações do autor (traduzindo-as do texto em inglês) recolocando sua estranha forma de escrever as palavras em língua romaní com uma forma mais exata e compreensível - por exemplo, o caracter "rr" não representa nenhum fonema em romanês; o som gutural do "r" está melhor representado como "rh", mesmo que nem todos os dialetos ciganos pronunciem desta forma, como o próprio gentílico "rom" se pronuncia "rhom", porém também simplesmente "rom". Geralmente o "h" se usa para indicar uma sonoridade alternativa da consoante que o precede e no caso no qual os acentos ortográficos, circunflexos e outros sinais não se podem reproduzir de maneira adequada, o "h" serve como a melhor letra complementar na maioria dos casos. Pessoalmente prefiro o alfabeto esloveno com algumas leves modificações para transcrever corretamente a língua romaní, porém na internet nem sempre é possível ver as páginas como foram escritas quando se usam sinais ortográficos não convencionais, portanto usarei a forma alternativa que consiste em agregar letras complementares. Para expor a teoria mencionada, começarei citando uma afirmação do autor com a qual estou completamente de acordo: " É sabido que na realidade não existe nenhum povo na India atualmente que possa estar aparentado com os rom. Os vários grupos etiquetados como "gypsies" (com "g" minúsculo) na India não tem nenhuma relação genética com os ciganos. Estes adquiriram o título de "gypsies" através da polícia colonialista britânica que no século XIX os chamou assim por analogia com os "Gypsies" da Inglaterra. Sucessivamente lhes aplicaram as mesmas leis discriminatórias que existiam para os "Gypsies" ingleses. Logo a maioria dos estudiosos europeus, convencidos de que o nomadismo ou a mobilidade são um caráter fundamental da identidade romaní insistiram em comparar os rom com várias tribos nômades da India, sem encontrar nenhum outro caráter em comum, porque suas investigações eram afetadas por preconceitos para com os grupos nômades". Isto é certo, os investigadores tomaram idéias preconcebidas sobre as quais fundaram suas hipóteses. Sem dúvida, o autor não é uma exceção e cometeu o mesmo erro. De sua própria declaração resultam as seguintes perguntas: Por que não existe nenhum povo na India aparentado com os rom? Por que toda a população cigana emigrou sem deixar o menor traço de si mesmos, ou alguns parentes? Há uma só resposta: porque não eram da India, sua orígem não pertencia àquela terra, e sua cultura era demasiado incompatível com a cultura indiana. Só uma minoria religiosa pode emigrar em massa de um país no qual a maioria dos habitantes pertencem a sua própria família étnica. E uma minoria religiosa naqueles tempos significava que era uma confissão "importada", não gerada no ambiente indiano. O presumido exílio em Jorasan exposto pelo autor como a razão pela qual o povo rom abandonou a India carece de fundamento, pois não dá uma explicação sobre as crenças e tradições ancestrais dos ciganos, as quais não são nem indianas nem islâmicas (porque Jorasan nessa época não era mazdeísta [ou zoroastrista] já desde muito tempo atrás), porém falaremos deste argumento mais adiante neste estudo. De toda maneira, o autor revela um mito na seguinte declaração: " Quanto às presumidas semelhanças entre o idioma romaní e outras línguas indianas, geralmente o punjab e o rajastani, trata-se sómente de um estratagema usado pelos nacionalistas que representam tais grupos linguísticos e defendem os interesses das respectivas nações: eles simplesmente tentam aumentar artificialmente o número da própria população". Este é exatamente o caso. Tive a oportunidade por mera casualidade de encontrar na internet grupos de discussão rajput/jat nos quais eles dizem estar convencidos de que os ciganos são um clan jat ou rajput. Se o fazem ou não em boa fé, o fato é que suas declarações são expressadas em um contexto nacionalista e parecem perseguir propósitos de tipo político. A principal presumida prova que apresentam é que os árabes chamavam aos ciganos de "zott", que significa "jat", desde o momento em que aparentemente chegaram ao Oriente Médio. Sinceramente, os escritos dos historiadores árabes são apenas um pouco mais exatos que as fábulas de "As mil e uma noites" quanto à precisão histórica. Havendo devidamente reconhecido estas importantes reflexões do autor da "teoria Kannauj", agora exponho suas afirmações sobre as quais fundou erroneamente toda a sua hipótese: "Contrariamente ao que normalmente lemos em quase todas as publicações, os primeiros rom chegaram à Europa conhecendo suas orígens indianas. Há evidências disto em vários documentos dos séculos XV e XVI. É só depois que a mítica orígem egípcia se propôs contra as versões que sustentavam a proveniência indiana. Sendo mais prestigioso, seria eventualmente mais fácil para a própria integração na Europa. Pouco a pouco o mito da orígem egípcia foi aceito como autêntico". Antes de responder a esta afirmação, desejo mencionar outra declaração na qual o autor se contradiz: "Entre todas as lendas, uma das mais difundidas é a da presumida orígem egípcia do povo rom, que eles mesmos começaram a promover no início do século XVI [...] Em ambos os casos, o prestígio do Egito com base na Bíblia e as histórias de perseguições sofridas pelos cristãos nesse país provavelmente alimentaram uma maior aceitação da lenda egípcia no lugar da orígem indiana, e provavelmente os ajudou a obter salvo-condutos e cartas de recomendação da parte de príncipes, reis e mesmo do papa ". (O espaço entre colchetes será mencionado depois) A primeira afirmação é inexata porque há documentos precedentes, inclusive do século XII d. c., nos quais os "egípcios" são mencionados em relação com os ciganos. Normalmente os rom foram chamados de distintas maneiras segundo a proveniência imediata, por exemplo na Europa ocidental os primeiros ciganos eram conhecidos como "bohêmios", "húngaros", etc. ( esta última denominação é ainda muito comum em muitos países), enquanto que os árabes os chamavam de "zott", significando "jat", porque provinham do vale do Indo. É certo que jamais foram chamados de "indianos" na Europa. Sem dúvida, tendo chegado à Europa pelo Iran e Armênia através do Bósforo, é improvável que tenham passado pelo Egito - existia na própria memória histórica o fato de que tenham estado antes no Egito, desde onde seu caminho errante começou, e assim declararam sua orígem mais antiga. Naquele tempo a India havia sido completamente esquecida. Antes de chegar a território bizantino, como o autor mesmo admite, os rom habitaram por longo tempo em países muçulmanos, e é certamente sabido que quem quer que tenha abraçado o islam dificilmente se converte ao cristianismo. Quando os ciganos chegaram a Bizâncio, já eram cristãos. Agora se apresenta um enigma interessante: Como podiam os ciganos conhecer A BÍBLIA em território muçulmano? Isto é algo que o autor não pode justificar de maneira nenhuma, porque na realidade os rom não conheciam as Escrituras senão só por ouvido até tempos muito recentes. Seguramente na India, na Pérsia e em terras árabes onde viveram antes de chegar à Europa não poderiam ter ouvido jamais nenhum comentário sobre a Bíblia, nem tampouco em Bizâncio ou Europa, onde o acesso às Escrituras estava proibido à gente comum e não existiam versões em língua corrente. Não há possibilidade de que os ciganos conhecessem a Bíblia a não ser somente no caso que a história bíblica estivesse profundamente radicada em sua memória coletiva. Esta memória se conservou durante o prolongado exílio na India de um modo tão forte que não adotaram nem sequer o menor elemento da cultura hindu nem de nenhuma outra existente na India. A maioria dos ciganos lê a Bíblia agora, e todos eles exclamam assombrados: "Todas as nossas leis e costumes estão escritos aqui!"- nenhum outro povo sobre a face da terra pode dizer o mesmo, exceto os judeus. Nenhum povo da India, nem de outro país. (Este é o espaço entre colchetes da citação anterior)
" Em todo caso, em Bizâncio em época primitiva, os adivinhos ciganos eram chamados de Aigyptissai, "egípcios", e o clero proibiu o povo de consultá-los para saber o futuro. Tomando como pretexto o livro de Ezequiel (30:23), os rom foram chamados de egípcios não só nos Balcãs mas também na Hungria, onde no passado referiam-se a eles como "povo do Faraó" (Faraonépek)e no ocidente, onde palavras provenientes do nome grego dado aos egípcios (Aigypt[an]oi, Gypsy e Gitano) se usam ainda em referência ao ramo atlântico do povo rom". Devia existir um motivo pelo qual em Bizâncio eram chamados de egípcios, motivo que o autor não explica. É que os ciganos sabiam que tinham estado no Egito em uma época remota do passado. Há outra palavra grega pela qual os ciganos eram conhecidos em Bizâncio: "athinganoi", da qual derivam os termos cigány, tsigan, zíngaro, etc. Os bizantinos conheciam perfeitamente quem eram os athinganoi e identificaram com eles os rom. De fato, a pouca informação que temos sobre esse grupo coincide em muitos aspectos com a descrição dos ciganos. Não há provas suficientes para afirmar que os athinganoi fossem rom, porém tampouco existem evidências do contrário. A única razão pela qual a possível identificação dos athinganoi com os ciganos foi descartada a priori é porque aqueles são mencionados no início do século VI d. c., época na qual, segundo os empedernidos sustentadores da teoria da orígem indiana, os ciganos não deviam estar na Anatólia. Os athinganoi eram chamados assim em relação a seus conceitos e leis de purificação ritual, considerando impuro todo contato com outro povo, muito similares às leis ciganas para os "payos" ou "gadjôs" (não ciganos). Praticavam a magia, a adivinhação, o encantamento de serpentes, etc, e suas crenças eram uma espécie de judaísmo "reformado" mesclado com cristianismo (ou com mazdeísmo/ zoroastrismo); observavam o Shabat e outros preceitos hebraicos, criam na Unidade de Deus, porém não praticavam a circuncisão e se batizavam (prática que não é exclusivamente cristã, senão também comum entre os adoradores do fogo). Quanto aos athinganoi, a Enciclopédia Judaica diz: "podem ser considerados judeus". Outro fator significativo é que os ciganos relacionam sua condição de constante movimento com o faraó, uma coisa que pertence exclusivamente ao povo hebreu. Os documentos mais antigos sobre a chegada dos rom à Europa constatam sua declaração de haverem sido escravos do faraó no Egito, da qual surgem duas possíveis deduções: ou era parte de sua memória histórica ou era algo que inventaram para ganhar o favor das pessoas - a segunda possibilidade é completamente improvável, posto que esta os identificaria com um só povo, exatamente o mais odiado na Europa e não era certamente a identidade mais conveniente para eleger. "Observando restos de precedentes migrações egípcias para a Ásia Menor e para os Balcãs, pensaram que seria proveitoso para eles fazer-se passar por cristãos do Egito, perseguidos pelos muçulmanos ou condenados a perpétuo vagar para expiar sua apostasia ". Esta foi uma sucessiva "correção" que inventaram depois de haver-se dado conta de que sua versão original da escravidão no Egito sob o faraó era auto-destrutiva porque eram etiquetados como judeus. Esta segunda versão é a que o autor considera " a mais antiga menção desta lenda, no século XVI d. c. ", porém a história original é muito mais antiga. Os ciganos nunca disseram que provinham da India até que alguns gadjôs no século XX lhes dissessem que haviam estudado muito e que a "ciência" estabelece que eles são indianos. A convicção do autor de que a pátria original dos rom era a cidade de Kannauj se baseia simplesmente sobre uma conjectura, reunindo elementos débeis que não provam nada e são facilmente desmentidos pelas evidências que exporei mais adiante. Agora leiamos sua hipótese: "...uma passagem do Kitab al-Yamini (Livro de Yamin), do cronista árabe Abu Nasr Al- 'Utbi (961-1040), se refere ao ataque do sultão Mahmud de Ghazni à cidade imperial de Kannauj, que concluiu com a pilhagem e a destruição da mesma e a deportação de seus habitantes até o Afganistão em dezembro de 1018...Sem dúvida, com base em crônicas incompletas que mencionam só algumas incursões na India norte-ocidental, não tem sido capazes de descrever inteiramente o mecanismo de tal êxodo...descreve uma invasão no inverno de 1018-1019, que chegou muito mais longe para o leste, mais além de Mathuta, até a prestigiosa cidade de Kannauj, 50 milhas a noroeste de Kanpur...No início do século XI, Kannauj (a Kanakubja do Mahabharata e do Ramayana), que se extendia por milhas ao longo do Ganges, era um importante centro cultural e econômico da India setentrional; não só porque os mais instruídos brâmanes da India afirmam ser de Kannauj (como ainda hoje), senão também porque era uma cidade que havia conseguido um alto nível de civilização em termos que hoje definiríamos como democracia, tolerância, direitos humanos, pacifismo e inclusive ecumenismo. Sem dúvida, no inverno de 1018-19, uma força invasora proveniente de Ghazni (atual Afeganistão) capturou os habitantes de Kannauj e os vendeu como escravos. Não foi a primeira incursão do sultão, porém as anteriores haviam chegado só até o Punjab e Rajastão. Esta vez chegou até Kannauj, uma cidade com mais de 50.000 habitantes e em 20 de dezembro de 1018 capturou a população inteira, "ricos e pobres, claros e obscuros [...] a maioria deles eram "nobres, artistas e artesãos", para vendê-los, "famílias inteiras", em Ghazni e Kabul (segundo o texto de Al-'Utbi). Logo, segundo o mesmo texto, Jorasán e Iraque estavam "cheios desta gente" . O que é que nos leva a pensar que a orígem dos rom tenha que ver com esta deportação?" Aqui o autor demonstra que não lhe importam minimamente os elementos culturais do povo rom, mas que está somente interessado em encontrar uma possível orígem na India e em nenhuma outra parte. Por conseguinte, muitos detalhes importantes tem sido completamente ignorados. Aqui menciono alguns: - Naquele tempo, a cidade de Kannauj era governada pela dinastia Pratihara, que não eram hindus e sim de etnia guijar, quer dizer, jázaros. Segundo as regras linguísticas, os termos hindus "gujjar" e "gujrati" derivam do nome original dos jázaros (khazar) através das regras fonéticas comuns destas línguas: os dois idiomas hindus, não tendo os fonemas "kh" ("j") nem "z", os transcrevem como "g" e "j" ("y"). Portanto, se os ciganos eram os habitantes de Kannauj não eram hindus e sim uma etnia muito próxima aos húngaros, aos búlgaros, a uma pequena parte dos judeus ashkenazim, aos bashkires, aos chuvashes e a alguns povos do Cáucaso e do vale do Volga... A designação "húngaros" que lhes é normalmente atribuida em muitos países ocidentais não seria tão errada - mais exata que a definição de "indianos" ou "hindus", em todo caso. • Se fora certo que os ciganos estiveram sempre na India até o século XI e.c. como afirma o autor, haveriam certamente praticado a religião mais difundida nessa terra, ou de todo modo teriam absorvido muitos elementos do bramanismo, especialmente se ser um braman de Kannauj era um grande privilégio que outorgava tanto prestígio. Sem dúvida, não se encontra o menor vestígio de tradição bramânica na cultura e espiritualidade romaní, ao contrário, não há nada mais distante do "romaimôs" (ciganidade) que o hinduísmo, o jainismo, o sikhismo ou qualquer outro "ismo" de orígem indiana. •O sultão de Ghazni era indubitavelmente muçulmano. O povo que ele deportou se estabeleceu no Afeganistão, Jorasan e outras regiões do Iran. Isto não haveria favorecido a adoção de elementos culturais do mazdeísmo - (zoroastrismo, que são muito evidentes na cultura romaní) mas ao contrário, teria contribuido a evitá-los porque os adoradores do fogo haviam sido praticamente aniquilados pelo islam - certamente um povo no exílio não teria adotado uma religião proibida para serem exterminados definitivamente! Portanto, o povo rom esteve em terras iranianas antes de chegar à India e sua cultura estava já bem definida quando chegaram ali. Existe um só povo que tem exatamente as mesmas características: os israelitas do Reino de Samaria exilados na Média, que conservaram sua herança Mosaica porém também adotaram práticas dos magos (classe social dedicada ao culto do fogo na Pérsia), e só uma coisa não conservaram: seu idioma original (como tampouco os judeus do reino de Jerusalém, já que o hebraico não se falou mais até a fundação do Estado de Israel em 1948 e.c.). Os judeus da India falam línguas indianas, porém são judeus e não indo-europeus. Tendo assinalados alguns dos pontos débeis sobre os quais se funda a teoria de Kannauj, é justo considerar as razões que expõe o autor: "Principalmente os seguintes pontos: •O detalhe "claros e obscuros" explica a diversidade de cor de pele que encontramos nos distintos grupos rom, porque a população original era mesclada. Havia provavelmente muitos rajputs em Kannauj. Esta gente não era aparentada com a população nativa, porém foram elevados à casta kshatrya por méritos. Portanto, eles devem ser a porção denominada "obscuros" da população". Esta afirmação é demasiado simplista para ser de um estudioso! Está bem estabelecido o fato de que os ciganos se mesclaram com várias populações durante suas longas travessias. Exatamente como os judeus. Basta visitar Israel para notar que há judeus negros, judeus loiros, judeus altos, judeus baixos, judeus com aspecto de indianos, de chineses, de europeus, etc. A crônica mencionada pelo autor demonstra que a população de Kannauj não era homogênea, não pertencia a uma só etnia. De fato, havia rajputs, gujratis e muitos outros, se a cidade era tão cosmopolita como parece. Isto não prova que os ciganos tenham sido a população de Kannauj. "•O fato que os escravos capturados provinham de todo tipo de classes sociais, incluindo nobres, explica como foi tão fácil para eles inserirem-se entre a gente importante e influente como reis, imperadores, e papas quando chegaram à Europa. Isto se deu porque entre os ciganos havia descendentes dos "nobres" de Kannauj. O indianólogo francês Louis Frédéric confirmou que a população de Kannauj consistia maiormente de "nobres", artistas artesãos e guerreiros." Isto é pura especulação. Os ciganos normalmente se davam a si mesmos títulos nobiliárquicos ou de prestígio com o objetivo de obter favores, salvo-condutos, etc. Isto foi praticado até há um século atrás pelos rom que chegaram à América do Sul, os quais se proclamavam " príncipes do Egito" ou nobres de algum país exótico. As autoridades começaram a suspeitar quando notaram que havia tantos príncipes de países estranhos. Há um detalhe importante que o autor não levou em consideração: Ele afirmou que Kannauj era um prestigiado centro bramânico. Como é possível que não existia uma casta sacerdotal no povo rom? O que aconteceu com os presumidos "ciganos brâmanes"? Todos os povos hindus tem uma casta sacerdotal, e muitos outros povos as tinham, incluindo os medos e persas (os magos) e os semitas, exceto um: os israelitas do Reino de Samaria - depois que se separaram de Judá, perderam a tribo de Levi e como consequência, nenhuma tribo foi dedicada ao sacerdócio. Havia nobres, artistas, artesãos, guerreiros e todo tipo de categorias sociais entre os norte-israelitas, porém não sacerdotes. O que é também importante notar é que os nobres israelitas eram muito apreciados nas cortes dos reis pagãos, e como tinham um dom profético particular, muitos israelitas entraram na classe dos magos da Pérsia, assim como outros se dedicaram à adivinhação, à alquimia e coisas similares. Sem esquecer que a arte da magia mais comum entre os ciganos é o "tarô", uma invenção judaica. "•Esta diversidade social da população original deportada pode ter contribuido para a sobrevivência da língua romaní, quase mil anos depois do êxodo. Como mostra a sócio-linguística, quanto maior é o grau de heterogeneidade social em uma população deportada, mais forte e largamente poderá continuar a transmitir o próprio idioma ." Esta afirmação não prova nada e é muito discutível, porque há muitos exemplos do contrário: a história prova que os hebreus foram levados ao exílio em massa, incluindo todas as categorias sociais, sem dúvida perderam o próprio idioma num tempo relativamente breve - o fato singular é que conservaram os distintos idiomas que adotaram na diáspora em lugar do próprio idioma original, por exemplo, os judeus mizraji ainda falam o assírio-aramaico, os sefaraditas ainda conservam o ladino (espanhol medieval) seis séculos depois de terem sido expulsos da Espanha, os ashkenazim falam o yiddisch, e os ciganos falam o romaní, a língua que adotaram no exílio. Outros exemplos de povos deportados ou emigrados de todo extrato social que perderam o próprio idioma em pouco tempo são os africanos da América, do Caribe e do Brasil, a segunda e terceira geração de italianos na América, Argentina, Uruguai, Brasil, etc., a segunda e terceira geração de árabes nesses mesmos países, etc. Outras comunidades conservam uma maior relação com o próprio o idioma, como os armênios, ciganos ou judeus. Não existe um parâmetro universal como o autor afirma.
"•A unidade geográfica do lugar de onde os ancestrais dos ciganos partiram é importante para a coerência do elemento indiano na língua romaní, porque as principais diferenças entre os diversos dialetos não se encontarm no componente indiano, mas no vocabulário adquirido em solo europeu ." Este fator não determina que a orígem tenha sido na área da India. É certo que o idioma romaní se formou inicialmente em um contexto indo-europeu, porém as mesmas palavras "indianas" são comuns a outros idiomas que existiram fora do sub-continente, quer dizer, na Mesopotâmia. As línguas hurríticas constituem a base mais factível da qual todas as línguas indianas surgiram (basta analisar os documentos do reino de Mitanni para compreender que o sânscrito nasceu nessa região). As línguas de raiz sânscrita já se falavam em uma vasta área do Oriente Médio, incluindo Canaã: os horeus da Bíblia (hurritas da história) habitavam no Negev, os jebuseus e heveus, duas tribos hurritas, na Judéia e Galiléia. Os norte-israelitas foram inicialmente estabelecidos pelos assírios em "Hala, Havur, Gozán e nas cidades dos medos" (II Reis,17:6) - esta é exatamente a terra dos hurritas. Depois da queda de Nínive sob a Babilônia, a maioria dos hurritas e parte dos norte-israelitas em exílio emigraram para leste e fundaram o reino de Khwarezm (Jorazmia), desde o qual sucessivamente colonizaram o vale do Indo e o alto vale do Ganges. É interessante notar que algumas palavras da língua romaní pertencem ao hebreu ou arameu antigos, palavras que não poderiam ter sido adquiridas num período mais tardio em sua passagem através do Oriente Médio em direção à Europa oriental, senão somente numa época muito anterior da história, antes de sua chegada à India. Existe ainda um termo muito importante e que os teóricos que sustentam a orígem indiana não levam em consideração: a denominação que os ciganos dão a si mesmos, "rom". Não existe nenhuma menção de nenhum povo rom em nenhum documento sânscrito. A palavra "rom" significa "homem" em idioma cigano, e há só uma referência a tal termo com o mesmo significado: em egípcio antigo, rom quer dizer homem. A Bíblia confirma que os antigos norte-israelitas tinham algumas diferenças dialetais com os judeus, e que eram também mais apegados à cultura egípcia assim como ao ambiente cananeu. A religião norte-israelita depois da separação de Judá era de orígem egípcia: o culto do bezerro. Por conseguinte, não é difícil que a palavra egípcia que significava homem tenha sido usada ainda nos tempos do exílio em Hanigalbat e Arrapkha (territórios onde foram deportados), e após. Porém, como a orígem não deve ser estabelecida através do idioma, não me extenderei na exposição deste argumento. "•Este argumento contrasta definitivamente a teoria que sustenta que os rom provêm "de uma simples conglomeração de tribos dom" (ou de qualquer outro grupo). É útil mencionar aqui que Sampson havia notado que os rom "entraram na Pérsia como um único grupo, falando um idioma comum" ." Concordo plenamente com este conceito. Porém é necessário ressaltar que a "teoria Dom" foi "a oficial" entre os estudiosos até há pouco tempo, e assim como esta foi desacreditada, qualquer outra que também insista com a orígem indiana se baseia em falsas premissas que conduzem a uma investigação contraditória sem fim. "• Provavelmente havia um grande número de artistas dhomba em Kannauj, como em todas as cidades civilizadas naqueles tempos. Como maior centro urbano intelectual e espiritual na India setentrional, indubitavelmente Kannauj atraía numerosos artistas, entre os quais muitos dhomba (quiçá, mesmo sem absoluta certeza, os ancestrais dos atuais dombs). Então, quando a população de Kannauj foi dispersa no Jorasán e áreas circunstantes, os artistas dhomba capturaram a imaginação da população local mais que os nobres e artesãos, o que explicaria a extensão do título dhomba em referência a todo o grupo de estrangeiros de Kannauj. Estes poderiam ter adotado este nome para si mesmos como o próprio gentílico (em oposição à designação mais generalizada de Sind[h]~, persa Hind~, grego jônico Indh~ com o significado de "Indiano" - do qual provem o nome "sinto", apesar da paradoxal evolução de ~nd~ a ~nt~, que deve ser postulada neste caso. De fato, em alguns dialetos romanís, principalmente na Hungria, Áustria e Eslovênia, parece apresentar-se esta evolução de ~nd~ a ~nt~)." Visto que o autor não encontra uma explicação verossímil para o termo "rom", recorre a subterfúgios especulativos que são absolutamente improváveis. Isto se manifesta em suas próprias expressões: "provavelmente", "quiçá", "poderia", "parece", etc... Toda a estrutura sobre a qual se funda esta teoria fracassa pela impossibilidade de explicar os caracteres culturais e espirituais próprios dos povos rom e sintos, e essencialmente, a afirmação de que"poderiam ter adotado este nome (dhom) para si mesmos como próprio gentílico" se revela completamente errada. O autor se contradiz a si mesmo, porque anteriormente havia declarado que "muitos kannaujis eram nobres", e logo supõe que estes mesmos "nobres" tenham adotado para si mesmos o nome de uma "casta inferior" como eram os artistas Dhomba. "•O fato de que a população proto-romaní provenha de uma área urbana e que eram maiormente nobres, artistas e artesãos pode quiçá ser a razão pela qual pouquíssimos ciganos se dedicam à agricultura até hoje. Ainda que "o solo da região fosse rico e fértil, os cultivos abundantes e o clima cálido", o peregrino chinês Xuán Zàng (latinizado como Hsuan Tsang) notou que " poucos dos habitantes da região se ocupavam da agricultura". Na realidade, a terra era cultivada maiormente para a produção de flores para fabricar perfumes desde a antiguidade (principalmente com propósitos religiosos) ." Esta afirmação também não prova nada, mas confirma ainda mais a hipótese de que realmente não eram de orígem indiana: uma comparação cuidadosa com o povo judeu leva à mesma conclusão, porque os israelitas de todas as classes sociais foram deportados de sua própria terra, porém os judeus nunca se dedicaram à agricultura e viveram sempre em cidades onde quer que estivessem na diáspora. Os judeus se fizeram agricultores só recentemente, no Estado de Israel, porque era necessário para o desenvolvimento da Nação. Há suficientes evidências para provar que quando os ciganos chegaram à India já eram um povo com as mesmas características que ainda hoje tem, porque tanto os norte-assírios como os assírios-caldeus (babilônicos) praticaram a deportação seletiva de ambos os Reinos de Israel e Judá, como lemos: "E (o rei de Babilônia) levou em cativeiro a toda Jerusalém, a todos os príncipes, e a todos os homens valentes, dez mil cativos, e a todos os artesãos e guerreiros, não ficou ninguém, exceto os pobres do povo da terra. Assim mesmo levou cativos a Babilônia a Yehoyakin, a mãe do rei, as mulheres do rei, a seus oficiais e aos poderosos do país; cativos os levou de Jerusalém a Babilônia. A todos os homens de guerra.." (II Reis, 24:14-16); "Mas Nabuzaradán, general do exército, deixou os pobres da terra para que lavrassem as vinhas e a terra" (II Reis, 25:12). A mesma coisa haviam feito 120 anos antes os reis assírios no Reino de Israel, e os camponeses que eles deixaram são os atuais samaritanos, enquanto que a grande maioria dos israelitas hoje se consideram "perdidos", e tem-se verificado que a maior parte deles emigrou para a India. "•Parece que um pequeno grupo fugiu da invasão navegando no Ganges e chegando até Benares, de onde devido à hostilidade da população indígena, se mudaram e se assentaram na área de Ranchi. Esta gente fala a língua sadri, um idioma indiano especificamente usado para a comunicação inter-tribal. É digno mencionar que o sadri parece ser a língua indiana que permite uma melhor comunicação entre seus falantes e o romanês." Novamente o autor especula teorizando uma relação entre uma tribo indiana e os ciganos somente através de uma aparente semelhança linguística, porém nada que tenha que ver com a cultura e a espiritualidade romaní, nem seus costumes ou tradições, e nenhuma prova histórica. Os idiomas são um ponto de referência relativo e muitas vezes enganosos, porque podem ser adotados por povos completamente diversos da etnia original. Provavelmente o autor não conhece alguns casos enigmáticos como o seguinte: há uma província na Argentina, Santiago del Estero, onde ainda se fala uma língua indígena pré-colombiana: o quíchua, um dialeto do idioma dos incas. O fato curioso é que quase todos os que a falam não são indígenas, mas sírios-libaneses que se estabeleceram nessa província há apenas um século atrás! Num suposto evento desastroso do futuro no qual se percam todos os documentos referentes à imigração árabe, os estudiosos do século XXV seguramente especulariam afirmando que esses árabes são os últimos autênticos sobreviventes da antiga civilização inca...O que não serão capazes de explicar é por que esses "incas" tinham tradições ortodoxas num país católico romano, ainda que ambas as tradições sejam muito mais próximas entre si do que a cultura cigana às da India. Outro exemplo similar nos dão os ciganos mesmos: na Italia norte- ocidental, o dialeto piemontês se fala cada vez menos entre os gadjôs, só as pessoas mais velhas ainda o conservam e já não é a língua principal das crianças piemontesas, que falam italiano. A conservação do dialeto depende exclusivamente dos sintos piemonteses, que o adotaram como a própria língua "romaní" e serão provavelmente os únicos que falarão esse dialeto ao final do presente século. Em uma situação imaginária como a descrita acima, os estudiosos do futuro chegarão à conclusão de que os autênticos piemonteses são os ciganos sintos dessa região... "•Ademais, os falantes do sadri tem o costume, durante cerimônias especiais, de verter um pouco de bebida, dizendo: " por nossos irmãos que o vento frio levou para além das montanhas" (comunicação pessoal por Rézmuves Melinda). Estes "irmãos" poderiam ser os prisioneiros de Mahmud. Porém é necessário um estudo mais intensivo sobre o grupo de falantes do sadri." Outra conjectura especulativa baseada sobre dados superficiais. As deportações eram frequentes naqueles tempos, e afirmar que se referem aos ciganos é mais que atrevimento. O que é mais significativo desta tradição sadri é que o "vento frio para além das montanhas" é dificilmente aplicável a uma deportação para oeste, para além dos rios, supostamente por um vento cálido; é mais bem coerente com uma deportação para o norte, para além do Himalaia, de onde sopra o vento frio. "•A deusa protetora de Kannauj era Kali, uma divindade que é muito popular entre os ciganos." Esta é realmente uma estranha afirmação para alguém que se considera um estudioso da cultura romaní, porque efetivamente os ciganos não tem a menor idéia da existência da deusa hindú Kali, e não tem nenhuma "popularidade". Não sei se o autor inseriu esta falsa afirmação com o único propósito de reforçar sua teoria, porém prefiro crer em sua boa fé. Não há nenhum elemento em minha família que possa levar a pensar que tal tradição tenha existido algum dia, nem tampouco existe entre as numerosas famílias de rom e sintos que conheci em todo o mundo, desde a Rússia até a Espanha, da Suécia à Itália, dos Estados Unidos à Terra do Fogo (a terra mais ao sul no mundo), de todos os ramos ciganos, dos kalderash, lovaras, churaras, aos calé espanhóis, dos sintos estraxaria e eftavagaria aos kalé finlandeses, desde os matchuaia aos horahanés sulamericanos. Desafio a quem quiser perguntar a um cigano quem pensa que é Kali - sua resposta será: "uma mulher negra", porque "kali" é o gênero feminino de "kaló", que significa negro (não porque eles saibam que o ídolo hindu é também negro). Conheço a maioria das famílias ciganas mais distintas no mundo, e sugiro ao autor visitar os rom da Argentina, onde por algum motivo a cultura cigana kalderash (russo-danubiana) se conserva de modo mais genuíno que em qualquer outro país . A devoção de alguns grupos para "Sara kali" na Camargue (sul da França) tem que ver com a tradição católica romana, não com o hinduísmo. De fato, há "vírgens negras" em quase todos os países católicos (inclusive na Polônia). Sara "kali" se chama assim porque é negra, e por casualidade ou não, tem o mesmo nome que a mãe do povo hebreu, o que pode ser a razão pela qual os ciganos católicos a elegeram como a própria santa. "•Ademais, o antigo nome da cidade era Kanakubja (ou Kanogyza em textos gregos), que significava "molestada, vírgem maculada". A orígem deste surpreendente nome se encontra numa passagem do Ramajan de Valmiki: Kusmabha fundou uma cidade chamada Mahodaja (Grande Prosperidade); ele tinha cem formosas filhas e um dia, quando brincavam no jardim real, Váju, deus do vento, se enamorou delas e quis casar-se com elas. Desgraçadamente foi rechaçado e as molestou a todas, o que deu o nome à cidade. Em outra versão, Kana Kubja era o sobrenome de uma devota molestada de Krishna, a qual o deus lhe deu um corpo restabelecido e forte como recompensa pela unção de seus pés. De fato, "vírgem molestada" era um dos títulos de Durga, a deusa guerreira, outra forma de Kali. Em outras palavras, podemos fazer uma identificação: kana kubja ("vírgem molestada") = Durga = Kali. Rajko Djuric mencionou algumas similaridades com o culto romaní de Bibia ou Kali Bibi e o mito hindu de Kali." Outra argumentação puramente especulativa sem qualquer apoio real. Histórias similares são muito comuns no Oriente Médio (recomendo ao autor ler "As 1001 noites" para uma melhor documentação). É perfeitamente sabido que os ciganos usualmente adotam lendas dos países onde tem sido hóspedes e as adaptam segundo sua própria fantasia. É também um fato que a maioria das lendas e fábulas etiquetadas como "ciganas" são por sua vez classificadas como "judias", e ambas se consideram a fonte original. Há também algumas lendas persas, armênias e árabes na literatura oral romaní. Pergunto-me por que o autor não menciona a popularidade que tem o Profeta Elias em muitos grupos Rom...quiçá porque não pode explicar a orígem indiana de tal tradição. Elias era um Profeta do Reino de Samaria. "•O tempo que os rom passaram em Jorasán (um ou mais séculos) explicaria os numerosos temas persas integrados ao vocabulário romaní (uns 70 - além de 900 temas indianos e 220 gregos), porque o Jorasán era uma região de língua persa." O mesmo parâmetro é válido para o exílio na India. Assim como tais palavras não provam uma orígem persa, tampouco o vocabulário indiano prova uma orígem indiana, porém só uma longa estadia. A exposição seguinte do autor está orientada puramente no aspecto linguístico, e ainda que seja uma argumentação coerente, não prova absolutamente a orígem em Kannauj, como veremos: "Outro elemento surpreendente é a coincidência de três caracteres linguísticos que conectam o romanês com as línguas da área de Kannauj, ou só principalmente com estas, quer dizer: - entre todos os idiomas indianos modernos, só o braj (chamado também de braj bhaka, um idioma falado por uns 15 milhões de pessoas na região a oeste de Kannauj) e o romanês distinguem dois gêneros na terceira pessoa do singular dos pronomes pessoais: yo ou vo em braj (provavelmente ou em braj antigo) e ov, vov ou yov, "ele" em romanês para o masculino. E ya ou va em braj e oy, voy ou yoy, "ela" para o feminino, enquanto que os outros idiomas indianos tem uma forma única, usualmente yé, vé, "ele, ela" para ambos os gêneros. Estes pronomes podem ouvir-se todos os dias nas ruas de Kannauj. - entre todos os idiomas indianos modernos, só os dialetos da área de Kannauj, alguns braj e nepalês (O Nepal está a sómente sessenta milhas de Kannauj) tem a terminação dos substantivos e adjetivos masculinos en ~o (ou ~au = ~o) idênticos ao romanês, que é também ~o: purano "antigo, velho" (em outros idiomas taruna, sinto tarno, romaní terno). De fato, a evolução dialetal de ~a a ~o depende de regras complicadas que devem ser ainda definidas. - E por último porém não menos importante, entre todos os idiomas indianos modernos, só o awadi (uma língua falada por uns 20 milhões de pessoas em uma vasta área a leste de Kannauj) apresenta como o romanês uma forma alternativa longa para a posposição possessiva. Não há só um estrito paralelo no próprio fenômeno mas também as posposições são idênticas em sua forma: agregado à forma curta (~ka, ~ki, ~ke) que é comum a todos os idiomas indianos, o awadi tem uma variante longa ~kar(a), ~keri, ~kere, exatamente como muitos dialetos arcaicos do romanês, como os da Macedônia, Bulgária, (~qoro, ~qiri e ~qere), Eslováquia e Russia (~qero, ~qeri, ~qere), forma que foi reduzida nos dialetos sintos ( ~qro, ~qri, ~qre). Ademais, uma missão recente em algumas aldeias da zona de Kannauj descobriu indícios de um idioma inexplorado similar ao romanês (tikni "pequeno", day "mãe" [hindi "parteira"], ghoro "jarra", larika "jovem" [hindi larhka] etc...). Isto justifica a afirmação do professor Ian Hancock que "o idioma mais próximo ao romanês é o hindi ocidental", comumente chamado braj, que divide a maioria de suas características com o kannauji moderno." Como eu disse anteriormente, o argumento é interessante, porém não prova nada, pelos seguintes motivos: •Todas as aclarações que assinalou o autor demonstram que o idioma romaní é gramaticalmente mais complexo que a maioria das línguas faladas na India, o que significa que quando os ciganos estavam na India, muito provavelmente existia um idioma muito mais homogêneo - ainda que não evoluído - para as várias línguas que por lógica linguística adotam formas gramaticais mais simples. Isto sucedeu, por exemplo, com o latim, que um tempo era falado em uma vasta área da Europa e que evoluiu para o italiano, o espanhol, o português, o catalão, o ocitano, o romeno, etc, todos os quais tem uma gramática mais simples. •Por conseguinte, como foi indicado, todas as línguas hindi ocidentais foram um dia um único idioma, do qual o romanês se separou num período inicial de sua formação. Esta etapa primitiva pode perfeitamente implicar no período hurrita, antes da estadia na India, porém é só uma suposição. O que se deduz em todo caso é que toda a família hindi ocidental, quer dizer, os idiomas do vale do Indo e do Rajastan, são descendentes diretos do suposto idioma "kannauji", o que implica que o romanês não deva necessariamente ter que ver com a zona de Kannauj e possa perfeitamente ter relação com toda a região desde o Kashmir até Gujarat, desde o Sindh até Uttar Pradesh. •É também certo que toda a região mencionada acima, da qual se supõe provem o romanês, não estava então relacionada com os povos indianos mas com tribos escita-sármatas estabelecidas no vale do Indo e em Sakastan, incluindo Kannauj (que era governada por uma dinastia gujjar) e que tem algo em comum: todas chegaram ali vindas do ocidente! Há evidências irrefutáveis de que os povos da região do vale do Indo eram "sakas" e não arianos. •O fato de que vestígios do idioma antigo ainda existem na zona de Kannauj não implica absolutamenteque essa seja a terra de orígem, e na história linguística há muitos exemplos: - no passado o celta era falado em quase toda a Europa, hoje sobrevive em algumas regiões das Ilhas Britânicas e na Bretanha, que não são a pátria original dos celtas. - tomando novamente como exemplo o latim, o idioma falado mais próximo hoje não é o italiano, mas o romeno, que geograficamente está muito longe do lugar onde o latim nasceu. - por um tempo em toda a Ucrânia se falava o húngaro e línguas aparentadas, por quase quatro séculos (entre Atila e Árpád), e hoje não há vestígios do húngaro na Ucrânia, mas se fala na Hungria, Transilvânia e áreas circunstantes. - da mesma maneira, o turco não foi falado na Ásia Menor até fins da Idade Média, e não existe mais em sua pátria de orígem. - acertou-se que o basco (euskara) se originou no Cáucaso, o extremo oposto da Europa de onde o basco se fala hoje, sem deixar nenhum indício intermediário na longa viagem que os antigos bascos realizaram, e não se fala em nenhuma zona do Cáucaso, onde há sómente línguas aparentadas. - o único povo que pode ler sem dificuldades as sagas nórdicas no idioma em que foram escritas são os islandeses e feroeses, enquanto que os suecos, noruegueses e dinamarqueses, cujos ancestrais as escreveram, dificilmente podem fazê-lo. - foi possível decifrar a antiga língua dos sumérios só com a ajuda do húngaro moderno, o que demonstra o quanto é impreciso relacionar uma língua com a área geográfica onde é falada no presente. Há muitos outros exemplos como os citados, porém estes devem ser suficientes. Ainda há outro argumento que o autor propõe: "No que concerne à cronologia do êxodo, esta coincide com o período de Mahmud, sendo claro que não pode ter ocorrido antes do século X d. c. porque o romanês apresenta duas características gramaticais importantes que se formaram até o final do primeiro milênio, quer dizer: a) a formação do sistema posposicional no lugar da antiga e média flexão indiana; b) a perda do gênero neutro com a assinalação destes substantivos ao masculino ou ao feminino. Como quase todos estes substantivos foram assinalados em romanês aos mesmos gêneros que no hindi (Hancock, 2001:10), se pode deduzir que este fenômeno se verificou quando o romanês ainda era falado em solo indiano. Portanto, o romanês se separou de outras línguas indianas só depois destas evoluções ." O que o autor não leva em consideração é o seguinte: não havia um idioma indiano unificado, mas existia um caráter distintivo entre a região escita-sármata e a região ariana. Ademais: a) a posposição é uma característica típica das línguas escito-sarmáticas; b) só os gêneros masculino e feminino existiam na variante do "antigo indiano" falado no vale do Indo, antes que os brâmanes conseguissem unificar toda a India ou a maior parte dela, portanto, o idioma também foi unificado e logicamente ambas as partes contribuiram. Porém a forma mais simplificada prevaleceu, pelo que o gênero neutro desapareceu da variante ariana. Não era necessário que os ciganos estivessem ainda na India quando o idioma foi unificado. O resto do estudo escrito pelo autor da "teoria de Kannauj" não tem que ver com a presumida orígem do povo rom mas com alguns dados históricos sobre Kannauj que não são importantes para esta investigação, portanto eu termino aqui os comentários sobre sua hipótese e começo a expor outros aspectos da cultura romaní que são certamente mais importantes que o idioma e demonstram que os ciganos não tem nada em comum com nenhum povo da India, nem no presente, nem no passado. Os aspectos que apresentarei aqui não podem ser explicados pelos sustentadores da teoria da orígem indiana. As características culturais e espirituais do povo rom podem classificar-se em duas categorias principais: 1)Crenças, leis, preceitos e tradições relacionadas com o hebraísmo, muito importantes no interior da comunidade romaní; 2) Práticas relacionadas com o culto do fogo e algumas crenças deste tipo, maiormente usadas nas relações com o ambiente não-cigano. Antes de expor estes aspectos, convém dar um breve resumo histórico de modo que o leitor possa entender melhor como e por que os ciganos estavam na India em um determinado período e por que não podem ser originários dessa terra. A "pré-história" romaní começou na Mesopotâmia, no baixo vale do Eufrates, sua "proto-história", no baixo vale do Nilo e em Canaã... Durante a expansão semítica no Oriente Médio, uma família semita se transladou de Sumer a Canaã e depois ao Egito, onde cresceu em número e importância dentro da sociedade egípcia, tanto que chegaram a ser odiados e submetidos a escravidão até que sua libertação chegou e abandonaram o país para se radicar em Canaã. Naquele tempo eram constituidos por treze tribos, uma das quais dedicada ao sacerdócio, e as outras doze eram o "povo", chamado Israel. Aquela nação tinha uma particularidade que a distinguia de todas as outras nações daquele tempo: criam em Um só Deus. Receberam um estatuto de leis, preceitos e artigos de fé que deviam observar e estabeleciam sua separação de toda outra gente, leis que concerniam a pureza e impureza ritual e outras características que faziam deles um povo particular, distinto de todo outro povo no mundo. Tinham uma memória comum, que haviam sido exilados no Egito, e uma herança comum, o conjunto de preceitos que estabelecia que se não os observassem, seu destino seria novamente o exílio, não no Egito, mas em toda a terra. Sem dúvida, apenas conquistaram sua terra, as diferenças entre a Tribo mais notável e as demais começaram a ser mais evidentes, até que o Reino se dividiu em dois: as Tribos do norte eram mais apegadas a seu passado egípcio e como sinal de sua separação elegeram um ídolo egípcio em forma de bezerro para representar o Deus Único (às vezes também adoraram divindades inferiores), e rechaçaram a Tribo sacerdotal, que se uniu ao Reino de Judá no sul. O reino setentrional de Israel permitiu práticas proibidas relacionadas com a magia, adivinhação e predição da sorte. No ano 722 a.e.c., os assírios invadiram o país e levaram cativa a quase toda a população, deixando só os camponeses, e levaram os israelitas ao exílio em outra terra que haviam conquistado: o reino de Hanigalbat-Mitanni, onde se falava um idioma muito similar ao romanês e cujas divindades principais eram Indra e Varuna. Esse país não era a India, mas ficava na alta Mesopotâmia. Os nativos dali são conhecidos na história como hurritas. Farei aqui um parêntese para dar uma breve descrição dessa nação antes de continuar com a história do nosso povo: Os hurritas, ancestrais dos povos da India A evidência mais antiga da existência de uma língua indiana não se encontra na India mas na bacia do Eufrates e do Tigre, desde o século XVI a.e.c. Ali estava o império de Mitanni, que se extendia desde a costa do Mediterrâneo até os montes Zagros, em conflito com os hititas no oeste e com os egípcios no sudoeste pelo controle do rio Eufrates. O idioma de Mitanni era hurrita; há uma clara evidência do vocabulário sânscrito nos documentos de Mitanni: ila-ni mi-it-ra as'-s'i-il ila-ni u-ru wa.na-as's'i-el (en otro texto a.ru-na-as'.s'i-il) in.dar (otro texto: in-da.ra) ila-ni na-s'a-at-ti-ya-an-na (cf. Winckler, Mitteilungen der Deutschen Orient-Gesellschaft No. 35, 1907, p. 51, s. Boghazkoi-Studien VIII, Leipzig 1923, pp. 32 f., 54 f.) Os quatros deuses mencionados neste tratado são os mesmos que encontramos no Rigveda (RV. 10.125.1). P. Thieme demonstrou que os deuses dos tratados de Mitanni são especificamente védicos. Varun.a e Mitra, Indra e N-satyau, com estes nomes se encontram somente nos escritos védicos. Porém, estão nos documentos hurríticos! No tratado entre os hititas e Mitanni, os reis de Mitanni juraram por: Mi-it-ra (índico Mitra), Aru-na (Varun.a), In-da-ra (Indra) e Na-as-at-tiya (Nasatya ou As'wins). Num texto hitita relativo ao adestramento de cavalos e ao uso dos carros de guerra escrito por Kikkuli (um hurrita) se usam os números indianos para indicar as voltas de um carro num percurso: aika (índico eka 'um'), tera (tri 'três'), panza (panca 'cinco'), satta (sapta 'sete') e na (nava 'nueve'). Em outro texto hurrita de Nuzi se usam palavras indianas para descrever a cor dos cavalos, por exemplo, babru (índico babhru 'marrom'), parita (palita "cinza") e pinkara (pingala 'rosa pink'). O guerreiro a cavalo de Mitanni era chamado "marya" (indiano-védico marya, 'guerreiro, jovem'). Ademais há uma série de nomes dos nobres e aristocratas de Mitanni que são claramente indianos. É já geralmente aceito pela grande maioria dos "experts" na materia que os vestígios linguísticos arianos no Oriente Médio são especificamente indianos e não iranianos, e que não pertencem a um terceiro grupo nem tampouco se devem atribuir a um hipotético proto-ariano. Esta conclusão foi incorporada na obra de M. Mayrhofer, em sua bibliografia sobre o argumento, Die Indo-Arier im Alten Vorderasien (Wiesbaden, 1966), e é a interpretação comumente aceita. Esta se baseia no fato de que quando existem divergências entre o iraniano e o indiano e quando tais elementos aparecem em documentos do Oriente Médio, estes últimos sempre concordam com o indiano. A divisão do proto-ariano em seus dois ramos, indiano e iraniano, deve necessariamente ter ocorrido antes que tais línguas se tenham estabelecido em seus respectivos territórios e não meramente como consequência de desenvolvimento independente depois que os indianos se estabeleceram na India e os iranianos no Iran. Esta conclusão poderia demonstrar-se errônea somente se se pudesse demonstrar que os indianos védicos, uma vez emigrados até a região do Penyab desde sua pátria primitiva tenham empreendido uma viagem de regresso até o Oriente Médio. Não há nenhuma evidência de tal eventualidade e por conseguinte uma teoria que suponha tal complicação pode ser ignorada com absoluta segurança... Uma conclusão ulterior em base a esta hipótese é que o período proto-ariano deveria ser antecipado muitíssimo tempo com respeito ao que se tenha estabelecido, e de todas as maneiras não poderia ser mandado a um período anterior ao século XX a.e.c., no máximo. Sarasvati é em primeiro lugar o nome proto-indiano de um rio no Iran, que depois da migração foi transferido ao rio da India. O nome iraniano, Haraxvaiti, é uma palavra tomada em préstimo do proto-indiano, com a substituição de h- por s-, o que ocorre também em Hind/Sindhu. Outro caso similar é o nome do rio Sarayu, que foi transferido do Iran (Haraiva-/Haro-yu) a um rio do noroeste da India, e após a um afluente do Ganges na India oriental. Os hurritas estavam presentes no Oriente Médio desde tempos remotos, o que se pode determinar em base a termos suméricos com ta/ibira, 'ferreiro em cobre', para o qual há suficientes provas que pertence a uma orígem hurrita (Otten 1984, Wilhelm 1988). Atal-s'en se descreve a si mesmo como o filho de S'atar-mat, de outra maneira desconhecido, cujo nome é também hurrita. A regra de Atal-s'en não pode ser datada com certeza, porém provavelmente pertence ao final do período gúteo (cerca de 2090-2048 a.e.c.), ou as primeiras décadas do período de Ur III (2047-1940 a.e.c.). Documentos do período de Ur III revelam que a área montanhosa ao leste e ao norte do vale do Tigre e do Eufrates eram então habitadas por povos de língua hurrítica, que eventualmente penetraram na região oriental do Tigre ao norte de Diyala. Como resultado das guerras de S'ulgi (2029-1982 a.e.c.), um grande número de prisioneiros hurritas se encontravam em Sumer, onde eram empregados em trabalhos forçados. Por este motivo, um grande número de nomes hurritas se encontram na baixa Mesopotâmia no período de Ur III. A etmologia de tais nomes é certamente ou quase seguramente indiana, por exemplo Artatama = védico r.ta-dha-man, 'cuja habitação é r.ta', Tus'ratta (Tuis'eratta) = védico tves.a-ratha, 'cujo carro surge com ímpeto', Sattiwaza = antigo indiano sa_ti-va_ja. 'que toma un botim', védico va-ja-sa-ti, 'aquisição de un botim' (Mayrhofer 1974: 23-25). O idioma hurrita se usava no século XIV a.c. ao menos até a Síria central (Qatna, e provavelmente Qadesh), e sua expansão provavelmente foi o resultado dos movimentos demográficos durante a hegemonia de Mitanni. Entre os deuses que eram ainda adorados no fim do século XIV pelos reis de Mitanni encontramos Mitra, Varuna, Indra e os gêmeos Nasatya, que cononhecemos através dos vedas, os poemas indianos mais antigos. A longa viagem para a India Voltando à história do nosso povo, o país descrito acima é onde os encontramos em 722 a. c. Este foi o começo da evolução de seu novo idioma adquirido, e o início do esquecimento da identidade do povo que foram no passado, exceto pela consciência de saber que eram diferentes, um povo particular que não pode mesclar-se com os "goyim" (logo "gadjôs", "payos"). Tem certos preceitos aos quais não renunciariam, as leis de pureza ritual e a crença em um Deus Único, o Deus que prometeu e cumpriu: seriam de novo espalhados e viveriam no exílio, quiçá para sempre...Não serão mais chamados "Israel", agora são só "homens", que seus ancestrais no Egito chamavam "rom". Depois da deportação assíria, os babilônios exilaram também os compatriotas do Reino de Judá, porém eles mantiveram sua identidade, sua estrutura social e sua Tribo sacerdotal, e 70 anos depois regressaram a Canaã, sendo então reconhecidos como "judeus". Em seu relativamente curto exílio, lograram resgatar parte de seus irmãos do antigo Reino de Samaria, porém a maioria deles permaneceu na diáspora. Babilônia caiu em mãos de uma nova potência, Média e Pérsia, um povo não semítico e de algum modo aparentado com os hurritas de Mitanni. Tinham uma religião particular que incluia o culto do fogo e a magia; de fato os membros da casta sacerdotal se chamavam magos. Os exilados, anteriormente israelitas e agora simplesmente "homens", rom, eram muito hábeis em tais artes e entenderam que praticá-las era proveitoso, pelo que adotaram tais elementos e os incorporaram na própria cultura, porém em função de suas relações com os outros, os gadjôs. O Império Persa era vasto, se extendia até Sakastan, mais além do Sindh. O vale do Indo era uma terra muito desejável, e teria ajudado a esquecer o exílio na Assíria, o lugar ideal para estabelecer-se e começar uma nova vida... Ultimamente há uma organização judaica internacional chamada "Kulanu" ("Todos nós") que se ocupa especialmente em encontrar as Tribos perdidas do antigo Israel e está logrando bons resultados em tal obra; há uma área particular no mundo onde muitos dos antigos israelitas "perdidos" tem sido achados: a India. Há descendentes dos israelitas deportados pelos assírios em cada rincão da India, desde o Kashmir a Kerala, desde Assam até o Afeganistão. Estão sendo identificados não através do idioma, pois falam línguas indianas, mas através de suas características culturais - Porém, nenhum deles tem tantos elementos hebraicos como os ciganos! É um fato acertado historicamente que as chamadas "Tribos perdidas" de Israel emigraram, segundo indiscutíveis evidências, para a India durante os períodos persa e macedônico, e que a maior parte preferiu estabelecer-se na região habitada por povos escita-sármatas, quer dizer, no vale do Indo, Kashmir, Rajastan e o alto vale do Ganges. Provavelmente não eram uma massa homogênea, pois emigraram em grupos separados para terras diferentes que geraram novas identidades étnicas, o que significa que os rom são somente um dos vários grupos israelitas que não conhecem sua própria orígem - a diferença é que os ciganos um dia regressaram ao ocidente e chamaram a atenção dos europeus, enquanto que os demais que permanecem no oriente seguem sendo ignorados e provavelmente perderam a maior parte das características que permitiriam identificá-los, características que o povo rom conservou num grau suficientemente aceitável. Um fator que os estudiosos não levam em consideração quando investigam o argumento da orígem do povo rom é a complexidade étnica da India naquele período e supoem que tenha sido uma população mono-étnica puramente ariana, o que é uma premissa falsa que leva a conclusões definitivamente errôneas. De fato, a região de população ariana começava a sudeste de Uttar Pradesh e ao leste de Rajastan-Gujarat, enquanto que estas regiões e as terras a oeste das mesmas eram habitadas por povos escita-sarmáticos, iranianos e inclusive helênicos, além dos exilados israelitas. Um estudo geral sobre os povos e tribos que habitam desde a India norte-ocidental até o Iran revela que quase todos eles, senão todos, mantém em suas tradições a crença de que seus ancestrais chegaram ali vindos do ocidente, normalmente relacionando tal movimento com os israelitas deportados ou com os contingentes de Alexandre Magno. Alguns clans pashtun assim como a maioria das tribos kashmiris proclamam ser de orígem israelita e inclusive alguns traçam sua descendência até o Rei Saul; uma tradição similar existe entre os kalash do Nuristan, um povo que em muitos aspectos se parece com os ciganos. Os exilados hebreus-assírios encontraram uma maior tolerãncia entre as gentes escita-sarmáticas que entre outros, e suas terras eram muito mais preferidas que as dos intolerantes arianos. O mesmo sucedeu a seus irmãos judeus. É significativo o fato de que a maior parte de ambos os povos, judeus e rom, encontraram um refúgio seguro na Europa escita-sarmática por muitos séculos: efetivamente, o centro de ambas as culturas foi a Europa oriental, particularmente Hungria e Rússia. O idioma romaní teria virtualmente desaparecido se os ciganos não se tivessem estabelecido nesses países, como está provado, a gramática romaní e grande parte do vocabulário se perderam na Europa central e ocidental, por causa de perseguições e proibição da manifestação da cultura cigana, da mesma maneira que aos judeus era proibido expressar o próprio judaísmo - sem esquecer o que pode significar para os ciganos ser chamados "arianos" depois da Shoah/Porhaymós... A estadia na Europa oriental inclusive determinou algumas características relativas ao vestir, de fato, o típico traje e chapéu que usam hoje os judeus ortodoxos ashkenazim pertence à nobreza polaca e báltica do final da idade média e período sucessivo. E não é muito diferente do traje e chapéu que usam os homens dos grupos rom mais "ortodoxos". Além do vestir, os ciganos normalmente usam costeletas abundantes, um aceitável substituto das "pe'ot" judaicas. Premissas para uma hipótese: •Os aspectos espirituais e culturais do povo rom coincidem exclusivamente com antigas características hebraicas; •Os elementos relativos ao culto do fogo presentes na sociedade cigana implicam que o povo rom esteve estabelecido na Pérsia por um período suficientemente longo para havê-los adotado, e necessariamente antes da dominação islâmica, o que significa, antes de haver chegado à India; •Alguns rudimentos culturais escita-sarmáticos presentes nos costumes ciganos são os únicos vestígios da estadia na India (além do idioma) e revelam que se estabeleceram na região não-ariana da India; tais elementos pertencem a esse período e não a um posterior, porque a cultura escita-sarmática tinha sido plenamente absorvida pelas civilizações eslavas e húngara quando os ciganos chegaram à Europa oriental; •Quanto ao idioma, é muito provável que os rom falassem já uma língua indiana antes de chegar à India e que essa língua tenha sido o hurrita, adotado durante os primeiros séculos do exílio na terra de Mittani. As evidências Há evidências irrefutáveis que concernem ao povo rom, que são a chave para descobrir sua verdadeira orígem e permitem elaborar uma trajetória histórica factível. Aqui apresento algumas delas. Credo As crenças ciganas mostram as seguintes características: •Estrito monoteísmo, sem o mínimo indício de algum passado politeísta ou panteísta. •O caráter muito pessoal de Deus, Que é acessível e com Quem é possível dialogar e inclusive discutir (concepção hebraica) - não é inacessível como Alá nem tampouco relativamente acessível como no cristianismo, que necessita de um Mediador para ter um contato pessoal com Ele. •A existência de um mundo espiritual que consiste em espíritos puros e impuros (concepção hebraica), que representam o bem e o mal e lutam constantemente - este conceito é originalmente hebraico, porém com uma marcada influência zoroástrica que é o resultado natural do exílio assírio/babilônico/persa e que se desenvolveu da mesma forma que o judaísmo cabalístico, mostrando uma evolução contemporânea da espiritualidade cigana e do judaísmo místico, no mesmo ambiente geográfico. •A crença na morte como uma passagem definitiva ao mundo espiritual (conceito hebreu). Não se encontra o menor indício da idéia da reencarnação. •A pessoa falecida é impura durante sua viagem ao reino das almas (conceito hebreu), e todas as coisas relacionadas com sua morte são impuras, como também o são seus parentes durante o período do luto (conceito hebreu). Maiores detalhes no tema seguinte, "marimé". •O destino final do cigano depois da morte é o Paraíso, enquanto que os gadjôs podem ser redimidos e ascender ao Paraíso se foram bons com os ciganos - uma idéia similar ao conceito judeu de "justo entre os gentis". Estes parâmetros de fé vão mais além da religião "oficial" que os ciganos possam professar. Geralmente há elementos adicionais que pertencem à coinfissão adotada, os quais expressam de modo pitoresco e observam com grande respeito, como por exemplo a "pomana", uma prática ortodoxa, e outras cerimônias. Também há particulares complementares de natureza supersticiosa, todos os quais tem sua orígem no culto do fogo da antiga Pérsia. Alguns são válidos no interior da sociedade cigana, como por exemplo ter sempre o fogo aceso em casa, dia e noite, inverno e verão (uma tradição que mantem as famílias mais conservadoras, enquanto que em geral está evoluindo para o uso de um fogo "simbólico" como a televisão, sempre acesa mesmo que não a esteja vendo ninguém). Outros costumes se praticam só externamente, como a adivinhação, leitura das mãos, tarot, etc., em cujos poderes particulares os ciganos não crêem porém os usam como meio de ganho no mundo dos gadjôs. Isto foi aprendido dos magos e alquimistas da Pérsia. Há fundados motivos para pensar que os rom eram já cristãos desde o primeiro século d. c., quer dizer, antes que chegassem à India ou durante o primeiro período de sua estadia nessa região, e é a razão pela qual não adotaram nenhum elemento hinduista em suas crenças. Resulta que os rom eram bem informados sobre o cristianismo quando chegaram à Europa, apesar de não haver tido a possibilidade de ler a Bíblia. Há algo misterioso na espiritualidade cigana que nas últimas décadas os levou a uma aproximação genuína aos movimentos evangélicos (a forma do cristianismo mais próxima do judaísmo, sem santos nem culto de imagens) e neste período muitos ciganos estão dando um passo sucessivo para o judaísmo messiânico. Não existe nenhum outro povo no mundo que tenha experimentado um tal número de conversões, quase em massa, em tão pouco tempo. O fato interessante é que este fenômeno não é resultado de obra missionária mas que se manifestou de modo expontâneo e autônomo (efetivamente, os gadjôs dificilmente se atreveriam a evangelizar os "ciganos", devotos das artes ocultas e da magia, segundo os comuns preconceitos). Contra toda probabilidade lógica, ciganos de distintos países e quase contemporâneamente, sem conhecer-se nem comunicar-se entre si, começaram a ler a Bíblia e formar suas próprias comunidades evangélicas. Agora existe a atividade missionária, porém é desenvolvida pelos ciganos mesmos e dirigida ao próprio povo. Isto se explica só considerando que existe uma herança atávica que é um fator especial da espiritualidade romaní. A maioria dos rom agora está abandonando práticas ancestrais originadas no culto do fogo e outras práticas proibidas pela Torá, como a pomana, a adivinhação e outras coisas. Uma conjectura factível (ressalto: uma conjectura) pode ser que a primeira aproximação ao cristianismo tenha que ver com os bíblicos "magos do oriente" que foram adorar ao infante Yeshua de Nazaré; evidentemente não eram simplesmente adoradores do fogo persas, mas pessoas que esperavam na promessa messiânica de Israel. Portanto, israelitas do antigo Reino de Samaria que nesse tempo estavam já completamente imersos no culto zoroástrico, porém esperando a redenção do próprio povo. Documentos históricos assinalam que no século I d. c. houve conversões em massa na Assíria, onde os apóstolos foram enviados a buscar as "ovelhas perdidas da Casa de Israel", e muitos habitavam precisamente nessa região. Outros apóstolos chegaram à India. Um fato curioso é que os israelitas recentemente descobertos na India são cristãos, não hindus ou de outra religião. A completa ausência de elementos hindus na espiritualidade romaní deve ter um significado. As leis rituais, "marimé" O conceito cigano de "marimê" equivale à forma negativa do conceito judeu de "kosher"; o primeiro indica impureza ritual, o segundo se refere à pureza ritual. A parte esta diferença de ponto de vista, a essência é a mesma (é como dizer se o copo está metade cheio ou metade vazio). O que para os rom é marimê, não ékosher para um judeu, portanto ambos tomaram as medidas necessárias para não serem contaminados, ou se se referem à uma contaminação inevitável ou indispensável, ambos seguirão certas regras para purificar-se. Da mesma maneira que é a kashrut no judaísmo, as leis que regulam o marimê são um valor fundamental na sociedade romaní e determinam os limites do ambiente social e espiritual, e condicionam suas relações com o mundo exterior (a sociedade dos gadjôs). Os Rom classificam todas as coisas em duas categorias: "vuzhô" (=kosher, puro) ou "marimê" (impuro). Esta classificação concerne primeiramente ao corpo humano, porém se extende ao mundo espiritual, à casa ou acampamento, animais e coisas. •O corpo humano: as regras que regem as partes do corpo que devem ser consideradas impuras são exatamente as mesmas que encontramos na Torá (Lei de Moisés), em Levítico cap. 15. Em primeiro lugar, os órgãos genitais, porque transmitem fluxos do interior do corpo, e a parte inferior do corpo, porque está abaixo dos genitais. A parte superior externa do corpo é pura, a boca em primeiro lugar. As mãos tem um caráter transitivo porque devem exercitar atos puros e impuros alternativamente, pelo qual devem ser lavadas de um modo particular, por exemplo se alguém deve comer depois de ter posto os sapatos ou levantado da cama (que é impura porque está em contato com o corpo inferior). Quando as mãos foram contaminadas, devem lavar-se com um sabão separado e secar-se com uma toalha separada para tal fim. Distintos sabões e toalhas se devem usar sempre para as partes superior e inferior do corpo, e não podem ser intercambiados. •Roupas: devem-se distinguir para serem lavadas separadamente, em diferentes recipientes destinados para cada categoria. As vestes impuras se devem lavar sempre no recipiente marimê, e os vestidos puros por sua vez se separam das toalhas e guardanapos, pois vão à mesa e tem seu próprio recipiente. As vestes do corpo superior e das crianças se lavam no recipiente vuzhô, os do corpo inferior no recipiente marimê. Todos as vestes da mulher são impuras no período das menstruações e se lavam com os artigos marimê. O único povo que aplica estas regras para lavar fora os ciganos são os judeus. •O acampamento: antes da recente urbanização forçada, o lar romaní era o campo, muito mais que a casa. O campo goza da categoria de pureza territorial, pelo qual as necessidades fisiológicas se devem fazer fora do mesmo e das proximidades (ou eventualmente, os serviços higiênicos se constroem fora do campo); este é um preceito judaico (Deuteronômio 23:12). O lixo também deve ser posto a uma distância aceitável do campo. •Nascimento: o nascimento de uma criança é um evento impuro e deve ocorrer, quando possível, em uma tenda isolada próxima, fora do campo. Depois do nascimento, a mãe é considerada impura por quarenta dias e sobretudo na primeira semana: esta regra é exclusivamente mosaica, estabelecida na Torá - Levítico 12:2-4 -. Durante esse período, a mulher não pode ter contato com coisas puras ou realizar atividades como cozinhar ou apresentar-se em público, especialmente na presença dos anciães, e não pode assistir a serviços religiosos. São destinados pratos, xícaras e utensílios exclusivamente para ela, os quais se descartam passado o período de purificação, assim mesmo os vestidos e a cama que usou se queimam, e também a tenda onde ela habitou durante esses 40 dias. Esta lei é completamente desconhecida para todos os povos, exceto ciganos e judeus. •Morte: como prescreve a Lei judaica, a morte de uma pessoa comporta impureza ritual para todos os familiares e todas as coisas que tenham sido involucradas nesse momento. Toda a comida que havia na casa do falecido deve ser jogada, e a família é impura por três dias. Devem-se observar regras particulares durante esses três dias, como lavar-se só com água para não fazer espuma, não pentear-se nem enfeitar-se, nem varrer, nem fazer furos, nem escrever ou pintar, nem tirar fotografias, e muitas outras coisas. Os espelhos devem ser cobertos. O acampamento onde ocorreu a morte é abandonado e transladado a outro lugar, ou se vende a casa aos gadjôs. A alma do defunto se crê que vaga por três dias para purificar-se antes de chegar a sua habitação final: isto não está escrito nas Escrituras Hebréias, porém é uma idéia comum entre algumas correntes místicas do judaísmo. O conceito que estabelece que o contato com o corpo morto implica impureza não se encontra em nenhuma tradição se não só na Bíblia (Levítico 21:1). Assim como está prescrito na Lei Judaica, também entre os rom é obrigatório que o corpo seja sepultado e não pode ser queimado. •Coisas: podem ser marimê por natureza ou por uso, ou ser contaminadas por circunstâncias acidentais. Qualquer coisa que entre em contato com a parte inferior do corpo é impura, como sapatos, meias, etc., enquanto que as mesas são puras. As regras que concernem estas leis são descritas em Levítico 15 e outras Escrituras Hebraicas. •Animais: os ciganos consideram que os animais podem ser puros ou impuros, ainda que os parâmetros em base aos quais são classificados diferem dos hebraicos. Por exemplo, cachorros e gatos são marimê porque lambem a si mesmos, cavalos, asnos e todo animal de monta é impuro porque a pessoa se senta sobre eles, etc. Os animais impuros não se devem comer. •Espíritos: os espíritos maléficos são marimê, o que é um conceito judaico. Leis matrimoniais O noivado e as bodas ciganas se celebram da mesma maneira que se fazia no antigo Israel. Os pais de ambos os esposos tem um papel essencial quanto a definir o dote da noiva, e as bodas se devem realizar dentro da comunidade rom, sem participação das instituições dos gadjôs. No caso em que a mulher foge com seu homem sem o acordo dos pais, o casal é automaticamente reconhecido como casado, porém a família do noivo deve pagar um ressarcimento aos pais da noiva, normalmente equivalente ao dobro do dote; tal compensação se chama "kepara", uma palavra que tem o mesmo significado do termo hebreu "kfar" (Deuteronômio 22:28-29). O pagamento do dote por parte da família do noivo aos pais da noiva é um regulamento bíblico, exatamente o contrário dos povos da India, nos quais é a família da noiva que deve pagar à do noivo. Há um preceito particular que deve ser observado para consolidar o matrimônio, o "pano da virgindade", que deve ser mostrado à comunidade depois da primeira relação sexual - este preceito está escrito na Torá, Deuteronômio 22:15-17. Logo, no caso de casais que fogem tal prática carece de sentido e portanto não é observada. Comportamento social Assim como os judeus, os ciganos assumem distintos parâmetros de comportamento para as relações com sua própria gente e para a interação com os estranhos, de modo tal que se pode afirmar que a oposição rom/gadjôs e judeus/goyim são reguladas de maneira muito similar, quiçá idêntica em quase todos os detalhes. Uma vez que os gadjôs não conhecem as leis que concernem ao marimê, são suspeitos de ser impuros ou se supõe que o sejam; alguns rom nem sequer entram em casas de gadjôs - o mesmo costume existia no antigo Israel, e ainda é praticado pelos judeus ortodoxos. Os gadjôs que se fazem amigos dos ciganos são admitidos quando conhecem as regras e as respeitam de modo que não ofendam à comunidade, depois de ter superado algumas "provas" de confiabilidade. Por outro lado, as instituições dos gadjôs se usam como "zona franca", onde se podem realizar atividades impuras com segurança - um exemplo típico é o hospital, que permite evitar de montar uma tenda especial para o parto. Cortesia, respeito e hospitalidade são obrigatórios entre os ciganos. Quando se cumprimentam cada um deve perguntar pela família do outro, desejando bem e bençãos para todos os membros, ainda que seja a primeira vez que se encontrem e na realidade não se conheçam as respectivas famílias. A própria apresentação inclui os nomes dos pais, avós e todas as gerações que se recordem - o nome e sobrenome civis não tem importância; os ciganos se chamam como no antigo Israel, A filho de B, filho de C, da família D. Isto é comum a vários povos do Oriente Médio, porém o modo como o fazem os ciganos é particularmente bíblico. As causas judiciais entre os rom se apresentam à assembléia de anciães, exatamente como na Lei Mosaica. A assembléia de anciães se chama "kris", e é uma verdadeira Corte de Justiça, cujas sentenças devem ser obedecidas, do contrário a parte inobservante pode ser excluída da comunidade romaní. Os casos geralmente não são tão sérios para não poderem ser resolvidos com o pagamento de uma multa ou ressarcimento, como está regulado na Torá (Êxodo 21:22, 22:9; Deuteronômio 22:16-19). Há muitos outros aspectos que podem ser de importância secundária, que mesmo assim recordam os antigos costumes e regras israelitas. Lamentavelmente, tais detalhes se vão perdendo com as novas gerações (como muitos se perderam entre os judeus também) por causa do sistema da sociedade moderna que restringe a liberdade de indivíduos e comunidades "exóticas". Porém, os sentimentos e tendências ciganas devem ser levados sériamente em conta, porque correspondem à uma herança psicológica ancestral que se transmitiu de geração em geração, de maneira subconsciente porém reclamando as próprias orígens. Por exemplo, os ciganos não sentem absolutamente nenhuma atração pela cultura ou a música da India (e mais, as mulheres ciganas tem um timbre de voz baixo, em contraste com as cantoras indianas, um detalhe que pode ser insignificante, porém quiçá não), enquanto que os ciganos gostam muito da música do Oriente Médio. Na Europa oriental, a maioria das expressões musicais são ou judias ou ciganas, e muitas vezes a mesma obra é atribuida ou a uma ou a outra destas duas tradições. As bandas de "klezmorim" tem sido muitas vezes compostas por rom junto com judeus, e o jazz de estilo europeu foi cultivado por ciganos e judeus. O flamenco é provavelmente de orígem sefaradita, praticado pelos judeus antes de serem expulsos da Espanha, e logo herdado e desenvolvido pelos ciganos. Em outros aspectos, os rom tem uma grande habilidade comercial (e se é necessário trabalhar em sociedade, os judeus são os preferidos) e aqueles que escolhem inserir-se profissionalmente na sociedade dos "gadjôs", preferem as mesmas carreiras que escolhem os judeus (provavelmente por motivos relacionados com as leis de pureza ritual, que não permitem que se exercite qualquer tipo de trabalho). Enfim, ainda que não menos importante, os ciganos fazem uma distinção entre os "gadjôs" comuns e os judeus, que não são considerados completamente gadjôs, mas como uma categoria intermediária que observa as leis de pureza ritual e portanto não estão sujeitos a suspeitas.
Conclusão: Este breve estudo tem como objetivo estabelecer as bases para uma nova, diligente e séria investigação sobre a orígem do povo rom e sintos, que seja fundamentada em aspectos culturais e espirituais em lugar de seguir sustentando uma linha exclusivamente linguística que leva a uma posição equivocada. As evidências apresentadas não excluem categoricamente que os rom possam ter habitado em Kannauj ou alguma outra parte da India, ainda que o vale do Indo pareça ser a região mais apropriada, mas demonstra que de todas as maneiras os ciganos não pertencem às etnias indianas (e muito menos arianas), e que suas raízes são semíticas e mais precisamente hebraicas. Grupos israelitas eram numerosos na India, e tem sido possível redescobrir alguns deles deixando de lado a indicação linguística (porque todos eles falavam línguas indianas) e concentrando a investigação em indícios culturais que revelam a verdadeira orígem, tais indícios tem sido até hoje menos determinantes que os que podemos encontrar na cultura romaní, porém tem sido suficientes para reconhecer a etnicidade israelita. Sándor Avraham traduzido por João Romano Filho «Não sabemos explicar muitos de nossos comportamentos mais expontâneos, porque fazem parte da nossa herança ancestral. Até que alguém acenda uma luz e nos diga claramente o porquê de detalhes que antes nem sequer notávamos. O extraordinário trabalho de pesquisa de Sándor Avraham é esta espécie de espelho, que nos deixa perplexos». João Romano Filho (Sinto Estraxhari do Brasil)

09/02/2012

A CHEGADA DOS CIGANOS AO BRASIL







CIGANOS NA HISTÓRIA DO BRASIL (1568-2005)
E SUA INFLUÊNCIA NA MÚSICA E NA DANÇA POPULAR
(Com respigos de folclore, poesia e glotologia)




Asséde Paiva Oliveira[1]

Rev. Acir Reis


Resumo:

Palavras-chave: Ciganos, escravos, folclore.

Referimo-nos aos ciganos no Brasil e esclarecemos várias questões como: De onde vieram? Quando vieram? Por que vieram? Onde foram estabelecidos? O quê comerciavam? Sua influência na expansão territorial, política, música, poesia e na dança. Onde entram no folclore. Focalizamos principalmente sua participação no comércio de escravos. Debret (artista francês que aqui esteve) não viu; se viu, omitiu que portugueses e brasileiros comandavam o tráfico negreiro. E Debret se tornou fonte de referência para os ciganólogos pósteros, que não se deram conta de que os ciganos, excluídos ontem e hoje, jamais poderiam ser grandes ou pequenos traficantes de escravos.



Abstract

Keywords: Gypsies, slaves, folklore.

This work is about the presence of gypsies in Brazil and explains several questions as: where did they come from? When did they come? Why did they come? Where were they established? What kind of businesses did they were involved? Their influence in the our territorial expansion; politics, music, poetry and in the dance. Their contributions to the folklore. We focused mainly on their involvement in the slaves trade. Debret (the French artist) omitted that Portuguese and Brazilians commanded the slave traffic. And Debret became a reference source for the gypsies researchers, that didn't perceived that the gypsies, excluded yesterday and today, couldn’t ever be a big or a small slave dealer.
DEFINIÇÃO

Cigano. [do grego bizantino athinganos, pelo fr. tzigane ou tsigane.] S. m. 1. Indivíduo de um povo nômade, provavelmente originário da Índia e emigrado em grande parte para a Europa Central, de onde se disseminou, povo esse que tem um código ético próprio e se dedica à música, vive de artesanato, de ler a sorte, barganhar cavalos, etc. [Designam-se a si próprios rom, quando originários dos Balcãs, e manuche, quando da Europa Central.] Sin.: boêmio, gitano, calom. (Novo Dicionário Aurélio, Século XXI, p. 470)

Escrever sobre ciganos é tarefa árdua, alguns pensarão que é tema perfunctório, mas sabendo-se que é uma etnia com 300 a 800 mil indivíduos no Brasil, mudamos de opinião. Vale o esforço. Pesquisei, analisei, busquei, manuseei tudo relacionado com cigano. Agora, submeto o resultado da busca à apreciação dos doutos leitores e leitoras...

E louvando em um dos maiores ciganólogos brasileiros: “...o cruzamento com as três raças existentes efetuou-se, sendo o cigano a solda que uniu as três peças de fundição da mestiçagem atual do Brasil”. (Mello Morais Filho, Os ciganos no Brasil, p. 27)

E vou afirmar agora e em outras páginas deste trabalho que cigano nunca foi escravista e que levou a culpa sem reclamar.

Deus! Ó Deus! Onde estás que não respondes?
Em que mundo, em qu’estrela tu t’ escondes
Embuçado nos céus?
Há dois mil anos te lancei meu grito,
Que embalde desde então corre o infinito...
Onde estás, Senhor Deus?...

Que tem este poema e os ciganos em comum? Há estreita relação. Primeiramente, o poema é de Castro Alves[2] (1847-1871), em Vozes d’África. Inicio por ele porque diz muito. É uma metáfora que lembra Jesus pregado na cruz, quando, segundo o Evangelho, em desespero e dor teria perguntado: “Pai, por que me abandonaste?” Castro Alves, com sua vibrante poesia, fez um apelo à sensibilidade dos homens para que cessassem o comércio hediondo dos escravos.

Castro Alves tem descendência cigana. Está em Gilberto Freyre[3] (1900-1987) que, aliás, só fez em sua obra esta citação favorável aos ciganos. O grande sociólogo, autor de Casa-grande e senzala; Sobrados e mocambos e muitos outros livros sócio-antropológicos, é bastante cáustico com os ciganos.

Ainda Castro Alves, que em seu grande poema: Navio negreiro, nos dá uma pista quem eram os comandantes dos tumbeiros (navios que traziam escravos para o Brasil). Em certo ponto do seu poema, ele canta: “Auriverde pendão da minha terra, que a brisa do Brasil beija e balança...” Então a resposta a uma dúvida está aí: Os navios negreiros, tumbeiros eram brasileiros, portugueses e outros, sob a bandeira do Brasil. Incrível! Há quem diga que os ciganos eram donos desses tumbeiros. Gastão Cruls, por exemplo. Outros também afirmaram assim e todos erraram. Alberto da Costa e Silva[4], em seu livro: Um rio chamado Atlântico, registra, no capítulo Na margem de cá, p. 158, colaboração de Eduardo Portela, o seguinte: “Os negreiros tinham a maioria de suas tripulações formadas por marinheiros negros...”

Corroborando esta afirmação, recentemente foi lançado livro com título De costa a costa[5], onde se estuda em minúcias as tripulações do tráfico negreiro, na parte II, pp. 159-184. É só consultá-lo e convencer-se de que ciganos apenas foram bodes expiatórios no caso do tráfico de negros.

Em História dos ciganos no Brasil, Rodrigo Corrêa Teixeira[6] (inédito) nos informa que, para o Brasil, vieram ciganos ibéricos e não-ibéricos, ou seja, calom e rom respectivamente. O rom[7] que aqui chegou mais cedo teria sido Jan Nepomuscky Kubitschek, que trabalhou como marceneiro no Serro e em Diamantina. Casou-se com brasileira. Em seu matrimônio com Teresa Maria de Jesus Aguilar, teve três filhos. O primeiro foi João Nepomuceno Kubitschek, que viria a ser um destacado político; o segundo Carlos Kubitschek e o terceiro foi Augusto Elias Kubitschek, um comerciante com escassos recursos, que viveu toda sua existência em Diamantina; casado com Maria Joaquina Coelho. Uma de suas filhas: Júlia Kubitschek, casou-se com João Cesar de Oliveira e foram os pais de Juscelino Kubitschek[8] (1902-1976), que depois se tornou presidente do Brasil. A árvore genealógica de JK, até o bisavô, está no site diamantinanet.com.br/juscelino/links/gene_materna.html

O definitivo depoimento sobre a origem cigana de Juscelino foi feito pelo jornalista João Pinheiro Neto (ex-Ministro) às entrevistadoras: Aspásia Alcântara Camargo, Helena Maria Bousquet Bomeny e Maria Luísa d’Almeida Heilborn, para o Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC), da Fundação Getúlio Vargas (FGV), de onde extraí este texto ipsis litteris:

Como o senhor definiria Israel Pinheiro? [Pergunta das entrevistadoras].

“O Israel basicamente é um grande capitão de obras, um grande construtor, um grande realizador, também sem nenhuma preocupação de ordem ideológica. Um pragmático parecido com o Juscelino em muitos pontos, menos na simpatia pessoal. Se bem que quando o Israel queria também era simpático; mas o Juscelino era sempre simpático. O Juscelino era um cigano. Quando fui à Tchecoeslováquia perguntei se havia Kubitschek lá. Aliás, a D. Sara já tinha estado lá e visto no catálogo que há centenas de Kubitschek. Ele era da Boêmia, daí gostar de violão, de música, de dança, de mulher.”

Possivelmente, Cecília Meireles[9] (1901-1964), grande poetisa, tinha em suas veias sangue cigano. Vários artistas, citando-se Carequinha, Wagner Tiso, Guerra Peixe (grande violinista) entre muitos, descendem de ciganos.

Há provas contundentes de que portugueses comandavam o tráfico negreiro. Na Biblioteca Nacional, encontram-se dois documentos definitivos: No primeiro, 99D,17,9, em Obras raras, negociantes lusos reclamam perdas e danos. Tem este título: “Das Perdas e Damnos experimentados pelos Negociantes Portugueses, em consequencia dos apresamentos e feitos pelas forças Britannicas nos Navios empregados no resgate de escravos até trinta e hum do mez de Maio de 1814.” [Grafia do original]. Segue relação de 35 navios. O outro documento é uma petição de negociantes de escravos contra o estabelecimento da quarentena de navios negreiros. Começa assim: “Dizem os negociantes desta Praça, sócios e consignatários dos de África, que...” [FBN-26,4,112, Seção Manuscritos]. Subscrevem quarenta e seis traficantes, todos portugueses.

Não há provas definitivas de que os ciganos participaram das “Entradas e Bandeiras” que tanto alargaram o território nacional. Mas é possível que sim, pela maneira de ser do cigano: sempre mudando, viajando... O que condiz com o sistema das bandeiras. Há esta pista em Dornas Filho[10] (1902-1962) “Moradores do termo de Mariana e dos distritos de Tapera, Turvo e Calambao representaram contra a ‘bandeira’ do capitão José Leme da Silva e seus irmãos, acusando-os de acoitadores de ciganos”. E também a magnífica frase do prof. Maffesoli[11], que a seguir transcrevemos: “Há belas páginas de Gilberto Freyre em Casa-grande e senzala, em que fala de nômades que chegam ao Brasil, são vagabundos, condenados pela justiça etc. e ao mesmo tempo é graças a essa espécie de barbárie que o Brasil pôde existir”.

Os ciganos vieram para o Brasil oficialmente em 1574, quando um certo João de Torres, tendo sido condenado às galés, fez petição ao rei dom Sebastião para que comutasse sua pena para degredo perpétuo no Brasil, visto que estava doente e não agüentaria as lides do mar. Entretanto, oficiosamente já estavam aqui desde 1568, quando para cá veio João Giciano, mulher e quatorze filhos[12].

Existiam disposições régias proibindo entrada de ciganos em Portugal e que aqueles que lá estavam, se intentassem manter seus modos de vida e sua língua, deviam ser expulsos para o Maranhão. Em 27 de agosto de 1865, Ordenações do Reino diz o seguinte: “Fica comutado aos ciganos o degredo da África para o Maranhão.” Em 15 de julho de 1686, Dom Pedro II, rei de Portugal, determinou que os ciganos vindos de Castela fossem exterminados e que filhos e netos (de ciganos) portugueses, tivessem domicílio certo ou enviados para o Maranhão.

Dom João[13] V (1689-1750), rei de Portugal, decretou a expulsão das mulheres ciganas para o Brasil. E no mesmo tom, anos a fio, promulgaram-se dezenas de leis, decretos, alvarás exilando ciganos para o Brasil. E eles aportavam no Maranhão, Recife, Bahia e Rio de Janeiro, onde estavam os núcleos coloniais mais importantes, mais desenvolvidos. O mesmo rei, Dom João V, proibiu-os de falarem o romani (língua dos ciganos). Os ciganos do Rio de Janeiro, foram para o sul e de lá para Uruguai e Argentina. Mas também vieram da Argentina para nossas plagas. O testemunho que se segue é valioso:

Note-se que os ciganos (não os do Rio) usaram as grandes estradas dos tropeiros e justamente entraram também no Brasil, pelo Rio Grande do Sul. Já fiz notar que suas barracas ao contrário das dos tropeiros, tinham os fundos e não a frente para o caminho, eram grupos étnicos fechados, e ao contrário dos viandantes brasileiros, tão hospitaleiros e nada amigos de lograr, a não ser na barganha de animais: Barganha, um ganha e outro arreganha[14].

Na guerra dos Farrapos, os legalistas apelidaram os revolucionários pejorativamente de maragatos, insinuando a identidade estrangeira dos revoltosos federalistas, que vinham do exílio no Uruguai, e entravam pelo Rio Grande do Sul à frente de um exército. Isso porque no Uruguai o termo nominava os descendentes de imigrantes espanhóis oriundos da Maragateria de León, onde eram tidos como ciganos.

Especulando um pouco, as mais importantes contribuições dos ciganos para nosso país foram negligenciadas pelos historiadores, qual seja, de co-participantes da integração e da expansão do território nacional. De norte a sul, de leste a oeste, em todos os lugares, lá estavam eles, viajando, negociando animais, arreios, consertando engenhos, alambiques, soldando tachos, levando notícias, dançando, executando atividades circenses, trocando objetos vários e lendo a buena-dicha. Mas como eram? Como viviam? Onde ficavam? Na verdade eram e são como hoje: alegres, prudentes, desconfiados, arredios e excelentes negociantes. Hoje não vendem tantos cavalos; entretanto, quando saíram de Portugal, nos primeiros anos após o descobrimento, à cata de aventuras, aportando em terras de Pernambuco, traziam grande número de eqüinos de raça árabe. Infiltrando esses animais pelo Piauí e por todo o norte brasileiro, formaram as bases ancestrais dos nossos cavalos nordestinos, que apresentam todas as características do sangue árabe. Agora, os ciganos vendem ferro velho, rádios, aparelhos de som, carros usados, sucatas e... lêem a sorte. Como sempre, não têm boa vida aqui, nunca tiveram. Jamais foram recebidos com festas.

Gustavo Barroso[15] (1888-1959), em seu texto A raça, admite que os ciganos tiveram grande influência no povoamento do Ceará. Está em seu livro Aquém da Atlântida, p. 268: Da,í passaram para a América e para o Brasi,l especialmente para o Ceará, onde várias de suas tribos forma despejadas por ordens régias ao tempo do grande Marquês de Pombal. E nesse fato muitos querem ver a fonte do espírito errante, do caráter nômade, da alma andeja dos filhos da terra de Sol. Este tema até hoje permanece obscuro, merece ser aprofundado. O governo de Pernambuco não só os expulsou para o Ceará, como também os encarcerou na Ilha de Fernando de Noronha (1739). Isto é fato, pois há uma belíssima poesia, a Cigana do cajueiro, coligida por F. A. Pereira da Costa[16] (1851-1923), adiante transcrita.

No Piauí, ocorreu um massacre de ciganos em 1912. Foram também expulsos para Sergipe D’el Rei. E nas Alagoas, uma curiosa proposição mandava que eles fossem evacuados/exterminados pelos juizes de paz.

Portaria de 1718 mandava prender todo cigano que andasse pela Bahia, com ou sem licença do governo e, na Carta de 1725, mandava caçar todos ciganos que resistissem; isto é, que fossem passados pelas armas. Apesar da perseguição interminável, o número de ciganos na Bahia cresceu tanto que foram obrigados a concentrarem-se em um bairro, a Mouraria, e depois em outro, Santo Antônio do Além do Carmo.

Com relação a Minas Gerais, terra proibida a estrangeiros, e os ciganos eram assim considerados, eles enfrentaram a situação e, naturalmente, como todos os homens e mulheres da época, procuraram enriquecer-se com ouro e diamantes, quer garimpando, quer negociando com garimpeiros. Existem bons livros sobre ciganos em Minas Gerais, entre eles exalta-se o de João Dornas Filho: Os ciganos em Minas Gerais. Mas quem o lê verifica a via-crúcis dos ciganos em MG. Não tiveram sossego, jamais. Perseguidos sempre, andavam de periferia em periferia das cidades, acampavam nos inóspitos lugares e negociavam ou montavam seus teatros mambembes e liam a buena-dicha. Eram detestados em Minas desde 1761, mas claro, estavam lá antes disso. Dornas Filho é quem nos indica que os ciganos procediam de todos os lados: de Belém do Pará, Maranhão, Ceará, Mato Grosso, Goiás, Rio de Janeiro, Pernambuco/Recife, confirmando a tese de que estavam em todo território brasileiro, desde cedo, e ajudando a ampliá-lo. Andando sem parar pelas estradas que não passavam de trilhas, foram conhecidos também como turcos, gringos e mascates. E quanta culpa levaram por causa dessa confusão étnica e profissional!

Não deixaremos de registrar uma carta de São Sebastião, aos 29 de julho de 1734, enviada pelo jesuíta italiano Domenico Capacci, eminente astrônomo e cartógrafo, dirigida a Martinho de Mendonça Pina e de Proença, governador da capitania de Minas Gerais que começava assim: “Um cigano a outro cigano, muita saúde e muita vida[17]”. Parece que o jesuíta era mesmo cigano, quanto ao governador, dúvidas temos, pois foi um intransigente perseguidor de ciganos, com atestam diversas cartas trocadas entre ele e Gomes Freire de Andrade, Capitão-general e governador da capitania do Rio de Janeiro, que teve sob suas ordens a capitania de Minas Gerais a partir de 25 de março de 1735[18].

Ciganos que aportaram no Rio de Janeiro foram expelidos para o Valongo[19] em 1771, local pantanoso e mais infecto da cidade. Leia Vivaldo Coaracy[20]:

No ângulo cujos lados as duas propriedades formavam ficava uma área que parece ninguém pretendera por inaproveitável. Constituída de brejos e alagadiços que as menores chuvas inundavam, tinha fama de pestilenta pelos miasmas que dela exalavam. Os pauis que formavam tornavam-na imprópria tanto para a lavoura como para que nela se erigissem construções permanentes. Nesse pantanal abandonado e desprezado, onde ninguém os viria incomodar, ergueram os seus míseros e toscos casebres de moradia os ciganos.

Quando a real história do Valongo for escrita, vão reconhecer o pioneirismo dos ciganos, pois foram eles que desbravaram aqueles pântanos onde hoje se situam os bairros Saúde, Gamboa e rua do Livramento. Mais tarde o comércio de escravos foi desviado da Rua Direita, hoje Primeiro de Março, para o Valongo e, então, os ciganos passaram a ser culpados pelo escravismo. Depois, com o saneamento da cidade, foram expulsos do Valongo, dispersaram-se, alguns se tornaram andadores do rei ou meirinhos honestíssimos, como nos diz Mello Morais Filho[21] (1844-1919). Inclusive participaram da polêmica contra o Estado, quando da eliminação do bairro de Catumbi, quando tiveram que conciliar duas posições antagônicas: a de meirinhos e a de residentes.

Os ciganos no Rio de Janeiro foram mais que meirinhos ou negociantes ou leitores de buena-dicha, também influíram na música e na dança popular. Faz parte do nosso imaginário e podemos afirmar que, quando falamos 'cigano', pensamos música.

Leiam no ótimo artigo de Ary Vasconcelos[22], na revista Piracema n. 1, ano 1, p. 107, o seguinte:

... e posso hoje, em primeira mão para Piracema [revista], oferecer dados novos que modificam e ampliam a história do samba, dando aos ciganos uma importância fundamental, até hoje totalmente desconhecida, e reciclando toda a geografia do gênero. Segundo informações de Pixinguinha e João da Baiana, cinco eram os principais redutos do samba na segunda década do século. [Interessa apenas o n. 1, para o caso em tela: A casa da tia Ciata].[23] Pelo Telefone nasceu na casa da tia Ciata. [...]. É que Pixinguinha e João da Baiana me revelaram [ao Ary Vasconcelos] que havia um grupo de compositores, cantores e músicos ciganos que cultivavam o samba com grande maestria e que trouxeram também uma contribuição importante, talvez decisiva, ao gênero. Eles mencionaram um deles ¾ o Saudade ¾ excelente cantor de sambas e que também freqüentava a casa da tia Ciata.

Em continuidade, colhi em Vozes[24], no excelente artigo do ciganólogo Ático Vilas-Boas da Mota[25], pp. 527-30, sob o título Ciganos: folclore e animais.

A presença dos ciganos no folclore brasileiro ainda não foi totalmente dimensionada nem estudada de maneira sistemática, isto é, o que dela se sabe só nos chega de maneira esparsa ou fragmentária, valendo ressaltar que tal não significa inexpressividade. [...] Acredito, no entanto, que a influência cigana em nosso folclore, é muito maior do que à primeira vista se poderia imaginar.

Na internet, sabendo-se pesquisar e separar o joio do trigo, ficamos ciente de que alguns dos maiores nomes da Mangueira foram ciganos, estavam de passagem por lá, que é o caso do imerecidamente esquecido Lauro dos Santos. Ver: www.academiadosamba.com
Quem diria?! Tem cigano no samba, que aliás é o título do artigo de Ary Vasconcelos na revista Piracema.

A internet é prodigiosa, torrencial, sem dúvida! No site há o seguinte: “Sabe-se da existência de um violão de sete cordas usado no século XIX na música popular russa. Ora, muitos ciganos (russos, inclusive) imigraram para o Rio de Janeiro neste período, concentrando-se no bairro do Catumbi”. Sugere-se que foram ciganos os introdutores do violão de sete cordas no Brasil.

Em trabalho recente e erudito, Samuel Araújo[26] e Antônio Guerreiro[27] apresentaram e defenderam a tese de que há muita contribuição cigana na música popular brasileira, citando Rugendas, in Viagem pitoresca através do Brasil, que o lundu era, na coreografia, no sapateado e na instrumentação, carregado de nuanças das danças ciganas. Que interessante!

Encontra-se em As mulheres de mantilha, p.110, de Joaquim Manoel de Macedo, informação de que, bem ou mal fundamentado, o lundu seria “imitação da zarzuela espanhola”, o que nos leva de volta aos ciganos e seus trejeitos.

Também está na internet em inúmeros sites:

Uma das brincadeiras mais estimadas no carnaval do Recife é a La ursa, cujas origens encontram-se nos ciganos da Europa que percorriam a cidade com seus animais, presos numa corrente, dançando, de porta em porta, em troca de algumas moedas, ao som da ordem: dança la ursa.” [28]
Mostradores de ursos também eram encontrados no interior de Minas Gerais, segundo Dornas Filho.

Se observarem nossas baianas e suas saias rodadas, e se compararem com usos dos locais de origem dos escravos da África, ficarão surpresos em verificarem que daquelas plagas não vieram os costumes de saias amplas, rodadas e longas, tudo é originado das nossas ciganas, aqui no Brasil. Nem hoje, nem ontem, povos africanos contribuíram com tais ou quais tipos de saias. E vamos pedir socorro novamente ao prof. Ático Vilas Boas da Mota[29]:

...o traje cigano tem servido, ao longo dos tempos modernos brasileiros, de sugestão para fantasias de foliões, além de motivos para carros alegóricos durante nossos carnavais, a exemplo de que vem acontecendo com o traje da ‘baiana’, estilizado pela famosa cantora Carmem Miranda (1909-1955). Evidentemente, estes últimos exemplos se enquadram no metafolclore ou nas denominadas manifestações parafolclóricas.

No Folclore pernambucano, in Anais Pernambucanos, de Francisco Augusto Pereira da Costa, encontramos referências a ciganos nos chamados pastoris (pequenas representações dramáticas com dança e canto, realizadas diante de presépio entre o dia de Natal e de Reis, inspirados nos autos da Natividade e nos vilancicos portugueses), onde algumas ciganas fazem parte do auto, declamando poeticamente a sorte do menino Jesus. Transcreve-se integralmente porque é muito comovente:

Somos ciganas do Egito
Que viemos de Belém,
Adorar a um Deus menino
Nascido p’ra nosso bem...

Atenção peço, senhores,
Para esta breve leitura,
E uma atenção piedosa
A toda e qualquer criatura.

Deste menino formoso
Vindo de origem divina,
Em suas mãos pequeninas
Eu vou ler a sua sina.

Dai-me licença senhora,
Guiai o meu pensamento,
Para dizer o que sinto
Para ler com acento.

Eterno rei desses céus,
Que dando ao mundo alegria,
Por prodígios só nasceu
Da Santa Virgem Maria.

Redentor da humanidade
Nascido p’ra nosso guia,
Mudou o céu em presépio
Transformou a noite em dia.

Se a boa dita e a nossa,
Quereis meu bem, que vos diga,
É a mesma que bem sabeis,
Mas permitais que prossiga.

Dai-me soberano infante
Dai-me esta linda mãozinha,
E vereis que uma cigana
A vossa sina advinha.

Primeiramente a meus olhos
Vejo com suma alegria,
Que sois com um grande extremo
Querido de uma Maria.

E prevenida ela um dia
Pelo supremo juiz,
Fugirá cedo convosco
P’ra o mais remoto país.

E decorridos doze anos
De tão doce companhia
Terás milhares de penas
Sem lhe escapar um só dia.

Enquanto andardes no mundo
Sereis sempre perseguido,
Mas, pelos prodígios divinos
Jamais vós sereis vencido.

Se um amigo no rosto
Certo dia vos beijar,
Às mãos cruéis da justiça,
Ele vos há de entregar.

Outro vos há de negar,
Em perguntas à porfia,
Respondendo que não sabe
Quem sois vós, minha alegria.

Não tereis vida mui larga,
Pois, com as mãos estendidas
Atirarão numa cruz
Uns ingratos homicidas.

E depois de redimirdes
A humanidade querida
Vencereis a própria morte,
Lograreis a eterna vida.

Se porque digo a verdade
Mereço eu uma esmolinha,
Dai-me só a vossa graça
E a todos desta lapinha.

Também conhecemos a linda fábula do folclore da Ilha de Fernando de Noronha, que diz respeito a uma cigana e se intitula O cajueiro da cigana. In Francisco Augusto Pereira da Costa, 1887, FBN II-418,3,26.

Conservara as tradições
que esbelta e linda cigana,
tinha aqui, pobre cabana
nestas ermas solidões;
certo, a buena-dicha lia,
porém disto não vivia.

Mas certos amores vendeu...
era bela o mais quem sabe?
Dizer a mim não me cabe,
depois dizem que morreu,
e por memória deixou
esta árvore que plantou.

Desde então, nesta paragem,
junto d’este cajueiro
apareceu ao caminheiro
um eqüestre personagem;
fronte altiva e marcial,
vestido de general.

Outras vezes, diz a gente
que um vulto — rara beleza,
pelas formas — com certeza,
mulher, — alma padecente
se vê perdida na estrada
como que vai de jornada.

Não se sabe o que julgar
dessa estranha aparição:
mas, afirmam que, um caixão
se se cavam há de achar
que é férreo cofre, um tesouro,
que contém da Holanda o ouro.

São antigos cabedais
que ajuntaram os holandeses;
herança dos portugueses,
amontoados na paz,
e, depois, de imiga guerra,
escondidas sob a terra.

Morreram... talvez — quem viu?
e essas imensas riquezas,
n’estas imotas devesas,
pela terra se sumiu:
Hoje, buscam uma oração,
talvez, — por d’ouro um caixão.

Quem sabe? mas, o que é certo,
verdade que muitos contam,
e vários fatos apontam
É que, d’esta árvore perto
uma noite — de passagem,
vira um preso uma visagem.

Meia-noite, mais ou menos
ouviu confuso tropel:
Olha, e lá avista um corcel
galopar nestes terrenos;
após outros mais atrás,
três ao todo, não eram mais.

E a cavalgada se avança,
pára junto do cajueiro,
num montava um brigadeiro,
galopa n’outro ordenança
n’outro alfim fradalhão
em guisa de capelão.

Trajava o velho general
gibão e armado chapéu;
o capelão — solidéu,
e o seu burel monacal:
E que por ser d’ordens passa
cimeira, lança e couraça.

O general se aproxima,
e a mão levando da espada
gesto frio — vista irada,
medir-lhe de baixo acima,
depois dá-lhe uma moeda,
e da vereda se arreda.

Assombrado quis correr,
no chão súbito caiu...
quando, após, o olhar abriu,
começava a amanhecer:
Todo o campo era deserto
mas estava de arv’re perto.

Depois, mais não viu tornar;
ou a outros revelavam
a causa porque penaram
e foram, alfim, descansar:
pois, após isto que aponta.
quarenta invernos já conta.

Contudo, inda há quem quer
que, caminho do Sueste*
arrastando uma’alma veste,
passa uma noite uma mulher.
Mais, não afirmo nem nego,
e a descrição isto entrego.

*É assim denominado o mais pitoresco e agradável sítio da ilha, necessariamente pela posição que ocupa, relativamente aos pontos do compasso.


Na coleção de estudos brasileiros, série Marajoara, no 20, lemos no Baile do Meirinho estes trechos inclusos em Bailes pastoris na Bahia, coligidos por Mello Morais Filho, Manoel Quirino, J. N. de Almeida Prado e Carlos Ott:

Surge uma cigana mercando:

As chitas finas e boas,
cambraias, lenços também;
de mimo eu vou levando
para as portas de Belém.

Venderei algumas
a quem encontrar,
menos as mais finas
que são p’ra levar.

Meirinho —

Alto frente, venha cá;
por você já esperava;
pois sabia que seus furtos,
você por aqui mercava.

Cigana —

Ladra, era sua mãe,
por todos reconhecida.
Seu pai, o seu ofício,
era andar na mesma lida.

Assim mesmo, andava sempre,
com algibeiras furreca;
seu sustento era cachaça,
baleia, feijão, muqueca.

Na roça de pai Antônio
Laranja você comprou
há seis meses desta parte,
o dinheiro não levou.

E assim meu camarada,
vá-se daqui andando,
vá procura quem for tola,
vá furtando, vá roubando.

Meirinho —

Assim atrevidamente,
insultas a categoria?
Hei de mostrar o valor,
da minha supremacia.

Cigana —

Largue minha capona
Me solte, senhor João;
não comece a me enfezar,
olhe que lhe solto a mão.


Existem outras versões de pastoris, porém, julgo que as apresentadas são suficientes para convencer da influência dos ciganos nestas festas populares, ingênuas.

Um dos costumes dos ciganos é o de apresentar o recém-nascido à Lua para tê-la como madrinha do filho, atrair boa sorte, proteção e saúde. A criança é erguida acima da cabeça pela avó ou tia, que recita:

Lua, Lua, luar,
Toma teu andar,
Leva esta criança,
E me ajuda a criar,
Depois de criar
Torna a me dar!

O texto supra é encontrado em Luís Câmara Cascudo, (Dicionário do folclore brasileiro, 2a edição, Instituto Nacional do Livro, Ministério da Educação e Cultura, Rio de Janeiro, 1962, p. 431). Ele nos informa que é herança de Portugal, mas temos indícios de que foram os ciganos que nos legaram este costume. Os que vieram de Portugal nô-lo trouxeram.

Existe no Brasil Central uma cantiga de roda que é inspirada nos ciganos:

Chora, chora, chora piranha,
Torna a chorar, piranha
Põe a mão na cabeça, piranha
Põe a mão na cintura,piranha
Faz um requebradinho, piranha
Mais um sapateadinho, piranha

Diga adeus ao povo, piranha..
Pega na mão de todos, piranha!
Piranha foi à missa, piranha
A saia dela caiu, piranha
Estava perto dela, piranha
E ela não me viu, piranha.

(In Vila Boa, História e folclore, Regina Lacerda; in Câmara Cascudo, Dicionário do folclore brasileiro)


A tal piranha faz o que se lhe manda, chorando, pondo a mão na cabeça, etc. Por fim, conseguindo agarrar a mão de qualquer dos da roda, puxa-o para o meio do círculo, tomando-lhe o lugar. Assim se continua.

Na literatura de cordel, satã, cigano e nova-seita (membro da religião protestante) em geral, compõem a tríade do mal. Extraímos esta sextilha em Violeiros do norte, in Leonardo Motta[30]

Pode-se achar sogra boa,
Padre desinteressado,
Italiano Inocente,
Cigano sério e honrado,
O que nunca ninguém viu
Foi nova-seita corado.

Alexandre José de Mello Morais Filho, autor de Os ciganos no Brasil e Cancioneiro dos ciganos,[31] faz, nesta obra, pp. 38-41, extensa e minuciosa descrição de uma festa de ciganos (bródio/abieu), no beco do Bem-bom, Rio de Janeiro.. Ele chama a dança de fandango. Transcreve-se parte.

O anu tem quatro figurantes: duas moças e dois homens.

A viola dá afinação mais alta, os cantadores variam as quadras, os velhos animam os pares com outros ditos:

— Bota pra baixo, menino! tudo por baixo!

Aos clamores destes recresce o entusiasmo, os violeiros tocam mais ativos e o coro repete o estribilho popular:

O anu é pass’o preto
Só faz casa no capão...

— Mistô![32] mistô! bradam os idosos ciganos, esfregando as mãos, batendo palmas estrepitosas.

Os figurantes requebram duas vezes, param, contemplam-se; as castanholas troam, as violas plangem acompanhando as trovas, as moças dançam juntas e depois os seus vis-a-vis.

Quando estes, isolados no salão, rompem no sapateado veloz, os instrumentos bambeiam no fandango, as cantigas são mais ternas, e, daqui, dali, d’acolá, sai um — bota pra baixo! — corta jaca! — bravo da letra! — que exprime o júbilo e a glorificação.

Apresenta-se esta dúvida: Foram, os ciganos, criadores desta dança ou somente a divulgaram?

O Dicionário musical de frei Pedro Sinzig[33] (1876-1952) ensina que: Fandango, palavra importada da Espanha, onde designa uma dança viva e voluptuosa, em compasso ¾ ou 6/8... A coreografia espanhola do fandango consta de sapateados e meneios; os dançarinos, evoluindo aos pares não enlaçados, mantêm os braços erguidos no alto da cabeça, tocando castanholas; o acompanhamento é feito por violões, e violinos ad. lib[34]. Com a palavra os musicólogos e pesquisadores de folclore.

Está bem provado no excelente livro de José Ramos Tinhorão[35]: Fado dança do Brasil cantar de Lisboa que houve simbiose entre o lundu e as umbigadas dos negros. Daí o fado junta não só o castanholado do fandango às umbigadas do lundu, mas também amplia o papel do canto, trocando estribilhos marcados por palavra pelo intermezzo[36] cantado...

E José de Alencar (1829-1897), em seu belo romance O Guarani, diz em um parágrafo, na 1a parte CENÁRIO: “Pouco distante, sobre uma cômoda, via-se uma dessas guitarras espanholas que os ciganos introduziram no Brasil quando expulsos de Portugal...” Note-se que a história se passa em 1604. Aditamos que o pandeiro, também, nos foi trazido da Espanha ou de Portugal pelos ciganos. A literatura[37], a iconografia[38] e a música são pródigas em exemplos de ciganos tocando este instrumento. Quanto às castanholas, é ponto pacífico: são próprias dos ciganos. Finalmente, os ciganos, pelas suas belas mulheres, são inspiração dos poetas e, em geral, dos compositores clássicos e populares: Carmen de Bizet, por exemplo. Entre romancistas, muitas vezes, os ciganos exercem papéis de vilões.

Encerramos aqui a problemática cultural dos ciganos na música e dança. Não estamos falando da dança peculiar dos nômades, isto poderia ser matéria para outro artigo.

Registra-se a valiosa contribuição dos ciganos para o circo no Brasil, tendo alguém dito que não se pode escrever a história do circo sem falar nos ciganos. A história ensina que em 1727, Dom Antônio de Guadalupe, bispo do Rio de Janeiro, com jurisdição nas Minas, pediu providências contra ciganos que realizavam “com grande aparato, comédias e óperas imorais”.

Viajantes, cientistas, aventureiros, comerciantes e militares estrangeiros que vieram ao Brasil, indiciaram os ciganos como comissários de escravos. E o português, o brasileiro e outras etnias? Até que se compreende, afinal aqueles senhores/viajantes precisavam da cooperação dos mandatários locais, para alcançarem seus objetivos. Governadores-gerais e vice-reis foram grandes traficantes. O rei de Portugal, vendo que era bom negócio, avocou o privilégio do tráfico. Mas os viajantes não viram isto, culparam os ciganos. Imaginem os ricaços da época, cheios de empáfia, poderosos, eles jamais tolerariam a verdade. Se os portos do Brasil foram abertos às nações amigas em 1808, é lógico que os “tumbeiros” foram, em esmagadora maioria, de propriedade de português ou brasileiro, cristãos-novos[39]
e/ou judeus. A corrente da escravidão é esta: Na África: ® pombeiros, tangosmanos / tangomaus ou lançados; ® No mar: os tumbeiros; ® No Brasil: comissários, comboieiros e tropeiros; e em todos os elos da corrente estavam os portugueses, brasileiros, cristãos-novos[40] e outros que não ciganos.

Um artista francês chegou ao Brasil em 1816, com a missão artística francesa e chamava-se Jean Baptiste Debret (1768-1848). Era um homem amargo, havia perdido o filho e separado da esposa. Ficou famoso por ter retratado o Brasil em 145 estampas (a maioria delas idealizadas) e por circunstanciadas descrições. Com respeito aos ciganos, ele fez três desenhos (pranchas): Mercado de escravos no Valongo; Interior de uma casa cigana e Cigano indo para a roça. Errou em todas, não retratou: idealizou/imaginou. Demonstrou ter mínimos/escassos conhecimentos sobre este povo. Foi, mais tarde, questionado ligeiramente por Bento da Silva Lisboa e J. D. Moncorvo de Ataíde, especialistas que analisaram suas aquarelas e concluíram que algumas eram verdadeiros deboches.

Felizmente, o excelente e conceituado jornalista Haroldo Ceravolo Sereza, em 6/1/2002, no caderno 2,de O Estado de São Paulo, levantou a questão: Por que Debret não teve coragem de mostrar que brasileiros e portugueses dominavam o comércio de escravos? E respondeu:

Debret coloca em duas pranchas ciganos no comando do negócio de escravos, o que é um pequeno delírio histórico — ou porque Debret não viu o óbvio, ou seja, que a elite brasileira comandava o negócio, ou porque o óbvio não podia ser visto.

Debret não iria condenar a elite e o patrão (conivente): príncipe regente; depois rei dom João VI. Assim, Debret precisava achar um responsável; pensou e criou um mito: a culpa é dos ciganos! Todos ou quase todos acreditaram nele, desde então. Tornou-se o magister dixit.

Debret, entre tantos erros, cometeu este: Na prancha do Cigano indo para a roça representou o cavalo em marcha que somente se vê em picadeiro e em quadros de elegia a Napoleão. É muito difícil treinar um cavalo para tal feito (leva-se mais ou menos sete anos para efetivar-se este treinamento) e não seria nessa marcha que iria para o campo. Ele não entendia mesmo de equitação.

Aquele que quiser se aprofundar no tema escravos/ciganos deverá ler meu manuscrito Brumas da história... RIHGB, citada, nota 1, do rodapé, onde contestamos todos aqueles que difamaram/vilipendiaram os ciganos. Concluímos, sem sombra de dúvida, que a participação dos ciganos, no comércio escravista, foi mínima, quase zero.

Em 1763, os ciganos participaram ativamente das festas em honra do primogênito de d. Maria I. Transcreve-se, na íntegra, o relato do livro Meios de transporte, no Rio de Janeiro, de Noronha Santos[41], p. 126. “Conforme a Epanáfora[42], citada por Varnhagem, constaram também estas festas de um desfile de carros das corporações de ofícios, carros e danças de ciganos que vieram com outras usanças até o século XIX...”

É histórico: grande número de ciganos acompanharam a comitiva de dom João VI em fuga para o Brasil, diante da invasão napoleônica a Portugal. Foi registrado pelo padre José Gonçalves Salvador, cognominado padre Perereca, que nas festas de casamento de dom Pedro I com dona Leopoldina, os ciganos fizeram muito sucesso com suas músicas, danças e cavalhadas, e com suas cantigas em língua própria. Ver tomo I:

... Finalmente entrarão pela Praça os Ciganos a cavalo, trazendo as mulheres na garupa; todas com ricos vestidos agaloados de ouro e prata, e, descendo dos cavalos, formarão, na frente do Camarim Real huma dança ao som de instrumentos, que foi grandemente applaudida pelo acerto, e primôr de sua execução” ...No tomo II este texto: ... E logo entrou na Praça a célebre dança dos ciganos, que compunha de seis homens, e outras tantas mulheres, vestidos todos com muita riqueza; pois tudo quanto apresentarão de ornato era veludo, e ouro, e sobre hum estrado fronteiro às Reais Pessoas executarão com muito garbo, e perfeição varias danças espanholas, que merecerão universal aceitação...

Agora, o texto de Mello Morais Filho:

Em frente do palanque real, o rico e humanitário cigano Joaquim Antônio Rabelo mandara arranjar, com maior galhardia imaginável, seu tablado de preciosas madeiras. [....] Joaquim Antônio Rabelo, a quem a história nacional talvez um dia considere como uma força das agitações políticas da independência, assim o determinara para o dançado dos ciganos, a quem ensaiara com entusiasmo artístico e vestira a sua custa [...]. Os ciganos guiando soberbos cavalos brancos arreados com igualdade e riqueza, balançando penachos implantados em discos de forma lunar, luzidos criados transpõem as barreiras. Os bailadores trazem as bailadeiras à garupa: morenas, sedutoras como as profetizas gentias [...] restabelecido o silêncio, voltaram jubilosos aos seus palanques. Preludiaram na guitarra uns acordes casados a vozes de uma cantilena em sua linguagem. A tradição olvidou a toada e as letras. Os dançarinos são aplaudidos e dom João VI, participando do agrado geral, fá-los virem a sua presença. Uma banda de música precede-os na maior ordem. Subindo o pavilhão, dois camaristas trazem, estendidos num coxim de púrpura, os prêmios que lhes eram destinados: patentes militares para os homens e jóias às mulheres. Joaquim Antônio Rabelo era sargento-mor de milícias da corte, foi-lhe concedida a mercê de melhoramentos de reforma no posto de tenente-coronel; e nomeados alferes agregados por ordenanças da corte, José Cardoso Rabelo, Manoel Lago, Antônio Vaz Salgado, Fernando José da Costa, José Luiz Mota, Baltazar Antônio Policarpo e João do Nascimento Natal.

O período de 1808-1818 foi a época de ouro dos ciganos no Brasil. Eles, olhados com bons olhos pela corte, por várias vezes foram chamados a participarem das festas de casamentos reais. Há registros que participaram do casamento da princesa da Beira com um infante da Espanha, conforme testemunho do Barão de Eschewege. Também outro evento foi registrado quando se elevou o Brasil a Reino Unido, em 1815. Tudo está nos livros de Mello Morais Filho, J. B. China (1874-1941), Rodrigo Corrêa Teixeira e outros.

Em João Dornas Filho, Ciganos em Minas Gerais, pp. 139-40 está: “Dom João VI pensou e levou a cabo a idéia de povoar com ciganos o vale do Jaguaribe, de que se origina a introdução do tracoma ou oftalmia egípcia no Brasil, principalmente no Ceará...”
[Nota: Na verdade, o tracoma nos veio da mãe África. Os ciganos também foram acusados de transmissores de lepra, agora já se sabe que a lepra, no-la trouxeram os escravos.]

No Estado de São Paulo, vários documentos atestam que os ciganos por lá passaram e lá estão. Augustin François César Prouvensal de Saint-Hilaire[43] (1779-1853) informa que topou com um grupo de ciganos em Urussanga e estabeleceu conversa com o capitão. Quando lhe disse da má impressão que traziam consigo, da sua esperteza nos negócios, o chefe respondeu-lhe: “É verdade, tentamos dar manta e, se conseguimos ou não, ficamos quietos; vocês têm a mesma intenção de nos enganar, porém quando não conseguem, espalham que foram iludidos por nós”.

J. B. d’Oliveira China[44] (1874-1941) relata as várias posturas contra os ciganos em São Paulo. Umas, mandando derrubar ranchos; outras, informando sobre ciganos vindo de Minas.

Francisca Roiz, cigana, em 1603 alimentou a comitiva do governador-geral, Francisco de Souza. Ela fora contratada pela Câmara para isso e saiu-se muito bem. Também montou a primeira loja em São Paulo. Na petição, a cigana se comprometia a ganhar apenas 10%, o que foi motivo de elogio, porque na terra paulistana imperava a idéia de lucros exagerados a curto prazo[45].

O Santo Oficio também importunou os ciganos por aqui. A doutora Laura de Mello e Souza, da USP, informa que Heitor Furtado de Mendonça, em sua 1a Visitação, em 1591, recebeu denúncias de ciganos por crimes contra a religião. Exemplo:

Violante Fernandes, viúva de um ferreiro cigano, também deportado de Portugal, agastada com as chuvas, dissera que “Deus mijava sobre ela que a desejava afogar”. Tareja Roiz ouvira da cigana Argelina que a cigana Maria Fernandes dissera: “que pesava de Deus porque chovia tanto”. In Primeira Visitação, Denunciações da Bahia, pp. 385-386. Tareja Roiz negava a existência do dia do juízo. Idem, p. 192. Apud Laura de Mello e Souza: O diabo e a Terra de Santa Cruz.

Os ciganos ainda hoje seguem sua sina. Espalhados em todo Brasil, uns ricos, outros pobres, extremamente pobres, fazem parte da nossa história, como nós outros fazemos. Temos de encontrar um modo de coexistência pacífica, afinal consideremos que todos nós temos alma um tanto cigana. Quem nunca sonhou em sair pelo mundo afora? E podemos ter, entre nossos antepassados, alguns de sangue boêmio. Aí estão Castro Alves, Juscelino Kubitschek, Cecília Meireles (talvez). Leiamos este trecho da poetisa, pleno de sabor e essência do espírito cigano:

Epigrama no 7

A tua raça de aventura,
quis ter a terra, o céu, o mar.
Na minha, há uma delícia obscura
em não querer, em não ganhar...

A tua raça quer partir,
guerrear, sofrer, vencer, voltar.
A minha, não quer ir nem vir.
A minha raça quer passar.
(Viagem)

Lemos em d’Oliveira China, apud Mello Morais Filho, que descendem de João Costa Ramos os conhecidos Costas, notáveis cantadores e tocadores de viola, francos e generosos; o velho tronco Luiz Rabelo de Aragão perpetuou-se nos Rabelos, poetas e literatos, entrelaçou-se com a família Cabral, que nos tem dado oradores parlamentares, oficiais do exército, homens conceituados no magistério, no fórum e na tribuna sagrada (sacerdotes). A família dos Helenas. Os Cantanhede, homens vencedores em vários ramos de atividade (engenheiros, médicos, professores, administradores).

Dizem que o poeta lagartixa, Laurindo Rabelo (1816-1864) era de origem cigana e é dele (apesar de vozes discordantes) este soneto, onde faz belíssimo jogo de palavras envolvendo o tempo e conta:

Deus pede estrita conta do meu tempo,
É forçoso do tempo já dar conta;
Mas como dar, sem tempo, tanta conta,
Eu que gastei, sem conta, tanto tempo?

Para ter minha conta feita a tempo,
Dado me foi bem tempo, e não fiz conta,
Não quis, sobrando tempo, fazer conta,
Quero hoje fazer conta e falta tempo.

Ó vós que tendes tempo, sem ter conta,
Não gasteis esse tempo em passatempo,
Cuidai enquanto é tempo, em fazer conta.

Pois, aqueles que sem conta, gastam tempo,
Quando o tempo chegar de prestar conta,
Chorarão como eu, o não ter tempo.

Melo Morais Filho (op. cit.) coletou mais de 500 trovas de autoria dos ciganos. Ele as dividiu em três tipos: as elegíacas (kachardins), mais propriamente tristes e que primam pelo subjetivismo e pela sentença; líricas (kambulins) e as funerárias (merendins). Vejamos exemplo de cada uma delas, na ordem citada:

Até nas flores se encontra
A diferença na sorte!
Umas enfeitam a vida,
Outras enfeitam a morte!

De contínuo ver frustrar
Tanta crença e esperança,
Té de um Deus a fé se perde,
Quem espera e não alcança.

Como as aves vagueiam
No seio da noite escura,
Assim serão meus suspiros
Sobre a tua sepultura.

Ciganos em seu eterno deambular, absorveram palavras de outros povos e também os enriqueceram com o linguajar romani. Em nosso idioma, dizem que são mais de cem verbetes (v. caló, p. 273, dic. Aurélio, Séc. XXI). Localizamos muitos, apresentaremos alguns na seqüência, todos retirados do Dicionário Houaiss, exceto se indicadas outras fontes.

baldroca — s. f. 1. Uso: informal. Engano fraudulento; trapaça, logro. 2 Regionalismo: Bahia (São Francisco). transferência mútua e simultânea de coisas entre seus respectivos donos; troca, escambo.

banza — s. f. 1. Derivação: por extensão de sentido. Regionalismo: Portugal. Uso: informal. guitarra portuguesa. 2. (1868-1911) Regionalismo: Brasil. viola ou violão

calão — Do espanhol caló. cigano caló, ‘cigano’. (Dic. Aurélio)

calim — s. f. Mulher de calom ou cigano. Obs.: cf. calom

caló. — s. m. Gloss. Língua falada pelos ciganos na Espanha, em Portugal, e no Brasil; calão, cigano, gitano, lusitano-romani, romani-ibérico, romenho.[É diferente de qualquer outro romani, uma vez que conta com um vocabulário ativo de cerca de 100 palavras do romani, com estrutura do português e do espanhol.] (dic. Aurélio)

calom — s. m. Regionalismo: Brasil, m.q. cigano ('indivíduo de um povo itinerante').

endrômina — s. f. ardil, impostura, artimanha; andrômina.

gade — s. f. 1 Rubrica: etnografia. Ritual de origem oriental praticado nos casamentos dos ciganos, em que uma sacerdotisa rompe o hímen da noiva com o dedo e limpa o sangue numa camisa que o noivo mostra aos convidados. 2 Rubrica: vestuário. Regionalismo: Brasil. Uso: informal, m.q. camisa 'peça de roupa'.

gajão — s. m. 1 indivíduo muito esperto 2 Regionalismo: Brasil. Forma de tratamento respeitosa (equivalente a 'senhor') dada pelos ciganos a pessoas estranhas à sua raça.

gamar — verbo transitivo indireto e intransitivo. Regionalismo: Brasil. Uso: informal, Ficar encantado, apaixonar-se, vidrar. Ex.:

marar — verbo. Uso: informal, transitivo direto. Matar; esfaquear.
Para Cândido de Figueiredo, orig. indiana, através de um rad. már-, conforme explicitado por Delgado; segundo este autor, o vocábulo prov. entrou na língua portuguesa através dos t. do hind. incorporados ao vocabulário dos ciganos.

pechincha — s. f.1 interesse ou vantagem material considerável; 2 lucro que não se espera e/ou que não se merece; 3 qualquer coisa cujo preço é muito baixo; barganha.

pelego — s. m. 1 Regionalismo: Brasil. A pele do carneiro com a lã; 2 Regionalismo: Brasil. Essa pele colocada sobre os arreios para tornar o assento do cavaleiro mais confortável. 3 Regionalismo: Brasil. Tapete rústico feito dessa pele.

pileque — s. m. Regionalismo: Brasil. Estado de bêbedo; bebedeira.

piranha – s. f. Dança, música. Regionalismo: Goiás. Dança de roda infantil em que um participante, colocado no meio de um grupo, deve fazer o que os outros mandarem

pirar — verbo. Uso: informal, intransitivo. 1 Retirar-se discretamente, cair fora, dar o pira. Ex.: pirou rápido sem falar com ninguém. Intransitivo e pronominal. 2 Uso: informal. Empreender fuga; evadir(-se), safar(-se). Ex.: posto na cadeia, pirou (-se) no dia seguinte. Intransitivo. 3 Regionalismo: Brasil. Tornar(-se) louco ou meio louco; amalucar(-se). Ex.: começou a falar sozinho, depois pirou de vez.
Pirar tem origem duvidosa, segundo Nascentes, do cigano; JM registra, com dúvida, “do cigano pirar 'fugir'?”; AGC considera incerta a origem do vocábulo.

punguista — adjetivo e substantivo de dois gêneros. Uso: linguagem de delinqüentes.1 que ou o que pungueia; batedor de carteiras, carteirista, punga, trombadinha.

rangar — verbo. Regionalismo: Brasil. Uso: informal, transitivo direto e intransitivo. Tomar (algo) por alimento; alimentar-se, comer.

rango — s. m. Regionalismo: Brasil. Uso: informal. Alimento servido numa refeição; comida; refeição.

rom — s. m. Designativo de cigano originário dos Bálcãs, entre os próprios ciganos.

romani — adjetivo e substantivo masculino. Relativo a ou um complexo de dialetos falados por ciganos de diferentes países e que genealogicamente pertencem à família indo-européia, ramo indo-irânico, sub-ramo indo-árico, grupo sânscrito; cigano. [Do cigano romani, cigano.] s. m. Gloss. 1.Língua indo-ariana falada pelos ciganos e que se subdivide em dialetos espalhados por diversos países do mundo. 2.Ver. caló. 3. vocábulo do romani. [Sin. ger.: cigano; tzigano. F. plural: romani] (Dic. Aurélio).

romenho — s. m. Rubrica: lingüística. Relativo a ou língua falada pelos ciganos de Portugal, e que não é mais que o espanhol influenciado pelo português e com aproximadamente 100 palavras do romani.

O professor Ático Vilas-Boas da Mota nos ensina (in Revista Planalto, Lingüística no 1, 2002, pp. 108-110) que as palavras gamar, rangar (rango), piranha (mulher vampiresca, dança de roda) são de origem cigana. Além disso introduziram em nosso léxico palavras que são empréstimos dos países por onde passaram: pileque (do romeno) e punguista (do romeno). E Manuel Viotti em Novo Dicionário da gíria brasileira, 3a ed. Livraria Tupã Editora, nos informa que os ciganos forneceram no conjunto, mais de 700 verbetes. (Nota de rodapé do Dicionário, citado).

É curioso (porque não é índole dos ciganos) mas é importante lembrar que em 1944, em plena guerra mundial, os ciganos de São Paulo levaram ao governo brasileiro sua solidariedade em face da agressão dos nazistas, ofereceram-se como voluntários em defesa da pátria, como também entregaram donativos em dinheiro e jóias de ouro, para auxiliar no custeio da defesa.

Como encerrar este trabalho? Dizendo que o Brasil não é a soma de portugueses, índios e negros. É muito mais! Existem milhares, quiçá milhões de outros indivíduos de outras etnias e entre elas sobressai a etnia cigana, ainda que seja invisível. Parafraseando o mestre Alexandre José de Mello Morais Filho[46]: Os ciganos foram a argamassa que uniu a raça brasileira. E no mesmo sentido preleciona João Dornas Filho (1902-1963), em Os ciganos em Minas Gerais. RIH-MG,V. III, ano 1948, p. 145: “Como se vê, não é tão pequena como se supõe a influência dos ciganos na vida brasileira. Não só na formação étnica e moral, mas também na formação política, eles têm concorrido para o nosso aprimoramento social”.

SOBRE O POVO CIGANO


BIBLIOGRAFIA

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10. DORNAS F., João. Os ciganos em Minas Gerais. Separata da RIHG de MG, v. III, 1948.
11. EPANÁFORA Festiva, ou Relação Summaria das Festas etc. Lisboa: Officina de M. Rodrigues, 1763. BN, Impressos, Cd 38-20-17.
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¾¾¾ Nordeste: aspectos da influência da cana de açúcar sobre a vida e paisagem do Nordeste do Brasil. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 1937.
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18 PEREIRA DA COSTA, Francisco. Folk-Lore pernambucano [RIHGB, tomo LXX, parte II, pp. 487-490].
19 RODRIGUES, Jaime. De costa a costa. Companhia das Letras: São Paulo, 2005.
20 RUGENDAS, João Maurício. Viagem pitoresca através do Brasil, 5a ed. São Paulo: Livraria Martins Editora, 1954.
21 SAINT-HILAIRE, Auguste de. Viagem à província de São Paulo. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: EDUSP, 1976. (Tradução de Voyage dans les provinces de Saint-Paul et Sainte Catherine; 1851).
22 SANTOS. Joaquim Felício dos. (Padre Perereca). Memórias para servir à história do Reino do Brazil, divididas em três épocas da Felicidade, Honra e Glória; escriptas na Corte do Rio de Janeiro no anno de 1821, e offerecidas a S. Magestade El Rei Nosso Senhor, o Senhor D. João VI. Tomos I e II que merecerão universal aceitação. Lisboa: Impressão Régia, 1825.
23 SANTOS, Noronha. Meios de transporte no Rio de Janeiro, 2a ed.. Rio de Janeiro: Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro – Secretaria Municipal de Cultura, 1996.
24 SINZIG, Frei Pedro. Dicionário musical. Rio de Janeiro: Livraria Kosmos Editora, 1947.
25 TEIXEIRA, Rodrigo Corrêa. História dos ciganos no Brasil. Recife: Núcleo de Estudos Ciganos, 1999.
26 TINHORÃO, José Ramos. Fado, dança do Brasil cantar de Lisboa. Lisboa: Caminho, 1994.
27 VASCONCELOS, Ary. Tem cigano no samba. Revista Piracema, ano 1, n. 1, 1993, pp. 105-109.
28 VERGER, Pierre. Fluxo e refluxo do tráfico de escravos entre o golfo do Benin e a Bahia de Todos os Santos dos séculos XVII a XIX. 4a ed. Salvador: Corrupio, Departamento Nacional do Livro, Fundação Biblioteca Nacional, 2002.


CRONOLOGIA, DATAÇÃO, EFEMÉRIDES IMPORTANTES NA CIGANOLOGIA BRASILEIRA
(Respeitou-se a grafia original)




1562 — João Giciano, mulher e quatorze filhos, são degredados para o Brasil. In Elisa Maria Lopes da Costa. O povo cigano entre Portugal e terras de além-mar, (p. 36).
1574 ¾ Dom Sebastião. Despacho sobre requerimento. A pena de galés imposta ao cigano João de Torres foi comutada em desterro para o Brasil, podendo vir acompanhado de mulher e de seus filhos. (Arquivo Nacional, Liv. 16 de Legitim. D. Seb. e D. Henr., fl. 189.) Apud Adolfo Coelho, Os ciganos de Portugal, (p. 200).
1578 ¾ Frei Vicente Salvador, na sua História do Brasil, informa que em Pernambuco Diogo Martins escreveu uma carta a Diogo de Castro “e lha mandou por um cigano”. Apud José Alípio Goulart. O cavalo na formação do Brasil, (p. 176).
1591 ¾ Heitor Furtado de Mendonça, visitador do Santo Ofício, na Bahia e Pernambuco, recebeu dezenas de denúncias contra ciganos como delinqüentes de crimes contra a religião e os bons costumes. In João Dornas Filho: Os Ciganos em Minas Gerais, em RIHG de MG), ano III, 1948. Laura M. Souza. O diabo e a Terra de Santa Cruz. (pp. 108-24); e Primeira Visitação do Santo Ofício – às partes do Brasil (Confissões da Bahia 1591-1593), série Eduardo Prado – São Paulo, 1922, pp. 57, 74, 166. Ver também “Denunciações da Bahia” 1591-1592, São Paulo 1925, pp. 259, 285, 303, 323, 385, 388 e 400.
1591 ¾ Violante Fernandes, viúva de um ferreiro cigano, também deportado de Portugal, agastada com as chuvas, dissera que “Deus mijava sobre ela que a desejava afogar”. Tareja Roiz ouvira da cigana Argelina que a cigana Maria Fernandes dissera: “que pesava de Deus porque chovia tanto”. In Primeira Visitação, Denunciações da Bahia, pp. 385-386. Tareja Roiz negava a existência do dia do juízo. Idem, p. 192. Apud Laura de Mello e Souza: O diabo e a Terra de Santa Cruz.
1603 ¾ Ordenações Filipinas. ...que não entrem no reino Ciganos, Armênios, Arábios, Persas nem Mouriscos de Granada. Ordenações Philipinas, liv. V, tít. 69.
1603 ¾ Primeira loja no séc. XVII, da Vila de São Paulo. Abre-a a cigana Francisca Roiz que diz se contentar com apenas 10% do lucro. E foi contratada para fornecer alimentos à comitiva de dom Francisco de Souza. “A nove dias de mês de agosto de mil seiscentos e três anos nesta vila na casa da Câmara, estando aí os Oficiais para fazerem Câmara e acordaram o seguinte — que era necessário haver na vila uma mulher que vendesse porquanto vinha o Sr. dom Francisco de Souza e gente com ele e para isso lhe pareceu bem Francisca Roiz, cigana, que o fará muito bem e logo lhe foi dado juramento dos Santos Evangelhos”. Ver Taunay, in História da cidade de São Paulo; Belmonte. No tempo dos bandeirantes, (p. 98) e José Alípio Goulart O mascate no Brasil. p. 128.
13 de setembro, 1613 ¾ Ley dos ciganos. “Dom Phillipe per graça de Deos, Rey de Portugal, & Algarves, d’aquem & d’alem, Mar em Africa, Senhor de Guine, & da conquista, navegação, comércio & Ethiopia, Arabia, Persia, & India, & c. [...] que eu mandei passar hum Alvarà feito em Janeiro de mil seiscentos & seis sobre os ciganos que fossem achados neste Reyno vagando em quadrilhas, & nelle residissem do qual o traslado he o seguinte [...]
[...] e achei por bem, que posto que pelas ordenações serão dee os ditos ciganos mais pena que açoutes pella primeira vez, que forem achados sejam degradados alem da dita pena, em tres annos para galés, & pela Segunda vez sejão outra vez açoutados, & em dobro: & pella terceira vez açoutados, & encorrerão nas ditas penas, & em dez annos”. [...] FBN 89, 5, 2, n. 20.
18 de janeiro, 1677 — Decreto. “os degredos que para o Brasil se proferirem, sejam com distinção: ou para a Bahia, ou para as capitanias de Pernambuco, Rio de Janeiro, Maranhão, Paraíba Tc..., os quais irão com ordem ao governador da parte para onde for o degredo, e se lhes faça o seu assento do dia em que chegaram, declarando-se nele os anos por que vão, e a era em que lhes findam, para nesse tempo se lhes dar certidão.” Apud António Gomez Alfaro: Ciganos e degredos.
27 de agosto, 1685 ¾ Ordenações do Reino diz o seguinte: “Fica comutado aos ciganos o degredo da África para o Maranhão”.
15 de julho, 1686 ¾ Dom Pedro II [rei de Portugal]. Registro de uma Provisão de Sua Majestade sobre ciganos. “Mandava-se que os que já tivessem entrado deveriam ser presos e desterrados de acordo com a lei já estabelecida a respeito com declaração que os crimes que a dita ley dá para a África sejão para o Maranhão”. Disposição confirmava em 27 de agosto do mesmo ano pelo “Decreto em que se mandou comutar o degredo da África para o Maranhão”. (Tombo II do Registro dos Alvarás, Provisões, Cartas e mais ordens de Sua Magestade, fl. 12. Archivo da Camara de Elvas, armario no 8. Apud Adolfo Coelho, op. cit.
1o de julho, 1704 ¾ Carta Régia: Os ouvidores podiam sentenciar os vadios que infestavam a capitania com a pena de degredo para Angola.
1708 ¾ Decreto de dom João V. Proíbe o traje, a língua, negócios de bestas e outras imposturas (ler sina). “Os que transgredirem essas disposições incorriam nas penas de açoites e seriam degredados pelo tempo de dez anos: ¾ o qual degredo para homens será de galés e para as mulheres, o Brasil.” Ordenações e leys etc, Lisboa, 1747. III, 170-171. Colleção chronologica de leis extravagantes. Coimbra, 1819, t. II pp. 364-366. Apud Adolfo Coelho, op. cit.
11 de abril, 1718 ¾ Decreto. “Foram degredados os ciganos do Reino para a praça da cidade da Bahia, ordenado-se ao governador que ponha cobro e cuidado na proibição do uso de sua língua e gíria, não permitindo que se ensine a seus filhos, a fim de obter-se a sua extinção.” In Melo Morais Filho, Os ciganos no Brasil.,(p. 26).
15 de abril, 1718 ¾ Havendo S. Majestade que Deus guarde resoluto que os Ciganos e Ciganas fossem exterminados do Reino pelos furtos, e mais delitos que freqüentemente cometiam, ordenou que fossem embarcados para as conquistas da Índia, Angola, Santo Thomé, Ilha do Príncipe, Cabo Verde, Ceará e Maranhão, e dos que vão embarcados na frota destinados para essa Capitania remeto a V. S. as relações... (Arquivos do distrito federal, IV pág. 404. Apud José Alípio Goulart ¾ O cavalo na formação do Brasil.,(p. 176).
15 de abril, 1718; 23 de agosto 1724; 29 de maio, 1726 e 29 de julho, 1740 ¾ Lê-se: “Se os ciganos e outros malfeitores, degredados do reino para Pernambuco, não adotarem nesta capitania algum modo de vida e continuarem a cometer crimes, serão novamente degredados para Ceará e Angola. Anais pernambucanos, volume 5 p. 299 de A. Pereira da Costa. Também Sílvio Julio, Terra e povo do Ceará, (pp. 89-90).
Junho de 1718 ¾ Portaria ao Provedor-mor, publicada nos Documentos Históricos, vol. LV, pág. 42, o Governador da Bahia mandava pagar quatro patacas a cada cigano que assentasse praça. Aos que de Portugal vinham para a Bahia não se lhes permitiam sair de Salvador, sob pena de prisão; é o que se lê de várias ordens expedidas aos Capitães-mores e Coronéis de outras localidades, de que é excelente exemplo a determinação contida nos Documentos Históricos, LV, pág. 54, datada de 20 de abril de 1718 e assinada pelo Marquês de Angeja. Em carta assinada pelo governador do Brasil, do ano de 1719 (dia e mês ilegíveis), dirigida aos Coronéis do Recôncavo, mandava-se prender todo cigano ou cigana, velho ou moço, que aparecesse nos seus respectivos distritos; “e sucedendo apresentarem algum despacho de licença deste Governo, Vossa Mercê o remeta junto com os preso”. Não adiantavam os salvo-condutos. Documentos Históricos, LXXIII, pág. 232. Apud José Alípio Goulart, op. cit., p. 176.
31 de julho, 1718 ¾ No governo de dom Pedro Antônio de Noronha, Marquês de Angeja, 3o vice-rei (1714-1718), chegavam os primeiros ciganos à cidade da Bahia. “Eu, Dom João, pela graça de Deus etc. faço saber a V. Mercê que me aprouve banir para essa cidade vários ciganos homens, mulheres e crianças ¾ ‘devido ao máo e escandaloso procedimento com que tem se portado neste reino’. Tiveram ordem de seguir em diversos navios destinados a esse porto, e tendo eu proibido, por lei recente, o uso de sua língua habitual, ordeno a V. Mercê que cumpra essa lei sob ameaça de penalidades, não permitindo que ensine a dita língua a seus filhos, de maneira que daqui em diante o seu uso desapareça.” Propagaram-se por tal forma os ciganos que se tornou a Mouraria pequena para contê-los pêlo que a Câmara designou também para moradia dos ciganos outro bairro da Freguezia de Santo Antônio d’Alem do Carmo. Apud José Carlos de Macedo Soares, em Santo Antonio de Lisboa, militar no Brasil. E In Resumo chronologico e noticioso da província da Bahia desde seu descobrimento em 1500. De José Alves do Amaral, apud José B. China, op. cit., p. 62.
20 de março, 1720 ¾ Proíbe-se a entrada de estrangeiros em Minas, refere-se explicitamente ao cigano. D. Lourenço de Almeida, capitão de Minas e de Pernambuco, então em Vila Rica, ordenava: [....] “pelo descuido que houve em algumas praças da Marinha, vieram para estas Minas várias famílias de ciganos, onde podem fazer maiores roubos que em outra nenhuma parte e, por esta devem ser infalivelmente presos e remetidos para o Rio de Janeiro, para daí se transportarem para Angola, porque só desta forma se continuará o grande sossego em que se acha todo este pais, não se experimentam roubos, o que infalivelmente haverá se nele se consentirem ciganos”. [....]. Elisa Maria Lopes da Costa in O povo cigano entre Portugal e terras de além-mar, p. 50 e João Dornas Filho, op. cit., p. 146.
14 de dezembro, 1720 ¾ Ordem para que os ciganos fossem estabelecer em Sergipe del-Rei. A. Pereira da Costa, op. cit.
1723, julho — Bando em Vila Rica: [...] “ordeno a todos os capitães-mores e mais oficiais de guerra ou justiça, que infalivelmente mandem prender todo o cigano ou cigana que aparecer e qualquer outra pessoa de qualquer qualidade ou condição que seja, que ande com eles em sua companhia, ou lhes dê acolhimento em sua casa, ou fazenda, e os trarão presos com todos os bens que se lhe acharem [....], outrossim ordeno que qualquer pessoa do povo de qualquer qualidade ou condição que seja, possa prender cigano e trazê-lo à cadeia da Vila que lhe ficar mais vizinha, tomando-lhe todos os móveis que tais ciganos tiverem, de ouro, roupas ou cavalos que serão da pessoa ou pessoas que prenderem os tais ciganos, com a condição de que primeiro os entreguem presos nas cadeias e, só dos ditos bens se tirará a importância que fizer o custo dos grilhões que se comprarão logo para se lançarem os ciganos” [....]. In Elisa Maria da Costa. O povo cigano entre Portugal e terras de além-mar (séculos XVI-XIX), pp. 69 e 70.
16 de dezembro, 1723 ¾ Carta da Câmara de Olinda ao soberano, informando que os ciganos viviam espalhados pela capitania, cometendo toda sorte de crimes... e em tal escala que não se podia mais tolerá-los... solicitando que fossem enviados para o Ceará.
23 de agosto, 1724 ¾ Os vadios, vagabundos, malfeitores e facínoras eram degredados para as possessões portuguesas da África, como consta da Provisão de 23 de agosto de 1724, mandando expulsar os ciganos para Angola.
21 de abril, 1725 ¾ Carta dirigida ao Coronel Antônio Homem da Fonseca Corrêa determinando: “Vejo a diligência que se faz para serem presos os cinco ciganos que por aí passaram e como causa de sua resolução se dificultou essa diligência, espero que Vossa Mercê a reforce de tal maneira, assim como destes... apareçam como com outros quaisquer que se consiga a sua prisão e não se entregando eles resistindo como fizeram outros, se atirará aos cabeças até matarem.” Vol. LXXII, pág. 96, dos Documentos históricos [Bahia] Apud J. Alípio Goulart, op. cit., p.176.
5 de outubro, 1726 ¾ O Procurador do Conselho requer medidas contra “huns siganos que apareceram na cidade (de São Paulo), os quaes, diziam ‘erão prejudiciais’ a este povo porque andavão com jogos e com outras reais perturbassoins.” In J. B. China, op. cit., p.64.
1727 ¾ Dom Antônio de Guadalupe, bispo do Rio de Janeiro (com jurisdição nas Minas Gerais) pede instruções ao Santo Ofício sobre como proceder com os ciganos que infestavam as povoações da Capitania, principalmente instaladas na Vila Rica de Ouro Preto, realizando com grande aparato, comédias e óperas imorais.
28 de outubro, 1732 — Bando do Capitão-general das Minas de Ouro, André de Melo de Castro [....] “Faço saber aos que este meu Bando virem que, porque em todas estas Minas se acham quantidade de ciganos e ciganas com grande escândalo e prejuízo destes povos pelos muitos furtos e insultos que todos os dias andam cometendo, e como sobre a expulsão desta gente se têm lançado vários bandos e expedidas várias ordens que todas dou por inclusas neste Bando, porque umas e outras se publicaram segundo as reais deliberações de Suas Majestade, ordeno por este Bando que da publicação deste a três dias, todo o cigano e cigana despeje todo governo das Minas, sem embargo de que mostre qualquer licença, ou dispensa, que tenha em contrário, que tudo dou por derrogado”. In Elisa Maria Lopes da Costa, op. cit., p. 51.
3 de junho, 1736 — Carta escrita em Brejo de São José, na Comarca de Serro Frio. [....] “se informará por si e seus oficiais dos ciganos que se acham neste Governo, para se conhecer onde pára uma quadrilha que assistiu no Rio das Contas e me dizem que nela tem Mestres de fabricar ouro falso, e os fará prender”[....]. Idem, Elisa Maria, op. cit., p. 51.
7 de maio, 1737 — Carta dirigida ao governador Martinho de Mendonça: “e lhe peço pelas chagas de Cristo mande exterminar fazendo, na mesma hora e tempo, pelas ordenanças prender em todas as comarcas a quantidade e multidão de ciganos e conduzir ao Rio de Janeiro pelos seus bens, pois lhe não faltam peças de ouro, e cavalos, ainda que furtados, que se vendem e dm para a Leva, porque aliás estas Minas, padecem grande dano havendo pessoas a quem têm levado cinco a seis cavalos.” Apud Elisa Maria Lopes da Costa. In Ciganos e degredos, p. 81.
1726, 1760, 1768 ¾ Atas do Senado da Câmara de São Paulo relativas a medidas a serem tomadas contra os ciganos, sendo que em 1760 formavam grande bando procedente de Minas Gerais, donde haviam sido expulsos.
13 de janeiro, 1737 — Carta do vice-rei despejando ciganos da Bahia em Minas: “por ora me parece acertado, castigando aos que cometerem algum insulto, não intender com os mais, porque não suceda juntarem-se em alguma parte remota, salteando os caminhos, o que agora seria de perniciosas conseqüências e dificultoso remédio estando tão dispersos os Dragões deste presídio.” Apud Elisa Maria Lopes da Costa, in Ciganos e degredos, p. 86.
5 de junho, 1731 ¾ Carta Régia, louvando o zelo e o cuidado com que o governador Duarte Sodré Pereira se houve nas remessas de gente criminosa para Angola, correndo a respectiva despesa pelo tributo da dízima. Mandando o governo da Metrópole observar o regimento dos Carcereiros decretado em 1681, determinou por alvará de 24 de abril de 1738, remetendo, mencionado regimento do Governador de Pernambuco para mandar vigorar na capitania, que o degredo que o mesmo Regimento impunha para o Estado do Brasil se devia praticar para o reino de Angola.
14 de agosto, 1736 ¾ Carta de Gomes Freire de Andrade, Governador de Minas, a Martinho Proença, informando que Enrique Carlos andou pelo rio São Francisco com ordem do senhor Conde para prender siganos no mês de dezembro”. Dornas Filho, op. cit.
1739 ¾ Desterrados para Fernando de Noronha todos os ciganos do Brasil, tidos como vadios.
1740 ¾ Carta Régia, resolvendo que vadios e sujeitos prejudiciais, cujos crimes coubessem a pena de degredo para Angola, fossem deportados para ali a fim de servirem no exército. In Melo Morais Filho, op. cit.
20 de julho, 1740 ¾ Provisão dirigida ao governador da capitania declarava que, mediante sentença do ouvidor, fossem degredados para Angola ¾ os vadios e indivíduos prejudiciais, cujos crimes coubessem a pena de degredo para aquela possessão, e na proporção que lhes pudesse acomodar, ¾ sendo tais indivíduos destinados a servir no exército. As deportações para Angola vigoraram até que a ilha de Fernando de Noronha foi constituída em degredo ou presídio. F. Antônio Pereira da Costa. Anais pernambucanos v. V 1701-1739.
1760 ¾ Alvará. Recomendava às autoridades da colônia que usassem medidas repressivas contra eles [ciganos]. Proíbe de comerciarem escravos. Os que não respeitassem as diversas disposições estabelecidas no dito alvará deveriam ser degredados por toda a vida para a ilha de São Thomé ou para a do Príncipe. (Registrado a fol. 351 do Lo. X do Registro do Real Archivo. ¾ Antonio Delgado da Silva, Colleção da legislação portuguesa, 1750-1762, pp. 749-750). Apud Adolfo Coelho, op. cit.
4 de outubro, 1760 ¾ Termo de Vereança ¾ (SP) visto que se refere a um grande bando desses nômades que aparecem na cidade. Atas da Câmara de São Paulo, IX, pág. 508.
12 de junho, 1761 ¾ Detectada presença de ciganos em Minas Gerais. Várias ordens do governador Luís Diogo Lobo da Silva ao sargento-mor Jerônimo Mendes da Paz, recomendando ações contra os ciganos.
27 de março, 1762 —Carta da Câmara de Minas, dirigida ao soberano: Costumam andar dispersos por todos estes continentes uns meramente ladrões disfarçados com o título de siganos tendo só por vida o viajarem com toda a sua família de umas para outras comarcas furtando cavalos e tudo o que podem por ser ofício próprio de semelhante casta de gente passando os furtos que fazem a uns e a outros para melhor encobrirem a sua maldade e indo seus donos no alcance de tirarem o que lhes levão os maltratam e muitas vezes matam (...) porque com os transportes que fazem para outros distritos lhes fica comutada a pena em degredo da própria vontade, sendo para utilidade do bem comum é preciso que residam em paragem certa com penas rigorosas para os que se acharem com semelhante modo de vida.” Apud Elisa Maria Lopes da Costa, in Ciganos e degredos, p. 82.
22 de outubro, 1768 ¾ Mandando derrubar um rancho de ciganos (SP). In J. B. China, op. cit., p. 63.
1768 ¾ Ata do Senado da Câmara de São Paulo repetindo quase na íntegra as outras duas de 1726 e 1760. Obs. As atas da Câmara Municipal de São Paulo estão, como publicação oficial do arquivo Municipal de São Paulo, enfaixados em diversos volumes impressos. Apud Renato Rosso, em Ciganos um povo de Deus, (p. 17).
1808 ¾ Portugueses e boêmios vieram para o Brasil, na comitiva real que fugia de Napoleão. In Melo Morais Filho, op. cit.
1809 ¾ Viajante inglês Henry Koster dá informações dos ciganos que percorriam os sertões de Pernambuco. Isto em 1809 a 1815, período de duração da viagem. Renato Rosso, op. cit., p. 17.
1817 ¾ Afonso de E. Taunay fala da impressionante quantidade de ciganos na corte de dom João VI. Id. Ibid.
1819 ¾ Saint-Hilaire encontra-se com numeroso grupo de ciganos em Mogy Guassu (São Paulo). In J. B. D’Oliveira China.
3 de junho, 1822 ¾ Felisberto Inácio Januário Cordeiro encaminha um memorial a José Bonifácio, que começa assim: “Respeitosamente dirijo à presença de V. Exa., com Procurador dos Moradores da Freguesia de Inhaúma, a cópia inclusa da Memória que fiz e remeti ao Intendente-Geral da Polícia sobre a segurança das estradas q. continuam a ser infestadas de salteadores ciganos” E a “Memória” encaminhada à autoridade policial, na primeira parte acusa o seguinte: “São tantos e tão continuados os roubos e assassínios praticados não só de noite, mas até de dia, pelas estradas que da Cidade do Rio de Janeiro seguem para o Campinho, Irajá e Penha, que se não derem quanto antes vigorosas e sucedidas providências em breve os caminhos se tornarão intransitáveis; e os ciganos, os vagabundos, os desordeiros e os escravos aquilombados, conhecendo que são perseguidos e castigados ativa e... elevando cada vez mais suas ousadias, temeridade e cruezas, passarão a formar-se em reforçadas quadrilhas que não só não darão quartel nas estradas passageiros, mas até assaltarão a viva força do fazendeiro e mais habitantes dos sítios e roças dentro de suas próprias casas; porque já tem passado ao terrível excesso de arrombarem cercas e portões e de irem às cavalariças furtar animais, e às casas, atacarem seus habitantes”. (111-25). Apud José Alípio Goulart, op. cit., pp. 177-8.
25 de janeiro, 1830 ¾ José de Melo Correia apresenta em sessão do Conselho da Província (de Alagoas) que “fosse evacuado esse povo [cigano] por intermédio dos Juizes de Paz”, porque: “Os ciganos não são brasileiros, pois, I. dizem que sua pátria é o Egito; 2. Não juraram o projeto da Constituição e menos consta que jurassem outra qualquer dos nossos vizinhos; 3. Não se acham alistados em corporação alguma desta província e, por isso não podem prestar serviços à mesma; 4. Finalmente não consta que eles tenham um pároco que os reconheça por seu fregueses. Dornas Fo, op. cit., p. 141.
1860 ¾ Posturas de Juiz de Fora. Art. 161. É prohibido comprar ou trocar escravos, animais etc. com ciganos e pessoas desconhecidas e suspeitas. Ciganos e suspeitos se denominão os que são por taes havidos; e não são moradores e estabelecidos no Município e nem tem pessoa capaz que os conheça e abone. In Gooduwin Júnior, J. W. Império do Brasil: nesta nação nem todo mundo é cidadão. Apud Cadernos de Filosofia e Ciências Humanas, pp. 29 e 32, ano V, no 9, 1997.
8 de julho, 1887 e 17 de março de 1888. O Pharol Juiz de Fora. [...] Diversas notícias referem-se ainda aos chamados “turcos” possivelmente ciganos, que pediam esmolas, impingiam bugigangas às pessoas sendo inclusive acusados de roubar crianças para comê-las. Idem, ibidem.
21 de março, 1892 ¾ A Câmara Municipal de Paracatu se reúne para discutir a presença de ciganos na periferia. É decidido que eles poderiam ficar por três dias, após este prazo seriam presos e pagariam multa de 20$000 por cigano preso. Fonte: Internet <>
1893 ¾ A cidade de Rio Preto é cercada por 500 ciganos. No mesmo ano é preso em Uberaba o cigano João Cristo. Apud Renato Rosso, op. cit., p. 19.
[...] O sr. Ministro da Agricultura tem notícia de que em um dos vapores esperados no Rio vém centenas de turcos ou bohemios sem profissão, telegrafou para os portos intermediários a fim de que não lhes fossem permitido o desembarque. No Rio foram dadas as mesmas ordens. O Pharol. Apud James William Goodwin Jr., in Cadernos de filosofia e ciências humanas. Belo Horizonte, ano V no 9, out./1997, pp. 29 e 32.
Junho, 1912 ¾ No governo de Miguel de Paiva Rosas (1912-1916), um bando de ciganos é massacrado pela polícia, no lugar Peixe (Nossa Senhora dos Remédios). In Dicionário Histórico e Geográfico do Estado do Piauí, de Cláudio Bastos. Teresina, 1994.
1808-1903 ¾ Os ciganos são perseguidos em Minas Gerais. In Rodrigo Corrêa Teixeira. Correrias de ciganos pelo território mineiro. Dissertação de Mestrado em História, UFMG.
1935 ¾ Notícia Diário da Bahia, tendo como título “A vida agitada dos ciganos”. Ao tratar dos ciganos da Bahia, fala-se sobre os Michlos, ciganos cearenses. As terras cearenses foram as que mais receberam ciganos de Portugal.. Apud Renato Rosso, op. cit., p. 20.
1944 ¾ Os ciganos de São Paulo levaram ao governo brasileiro a sua solidariedade em face da agressão totalitária, [da Alemanha], oferecendo os seus serviços militares em defesa de nossa pátria, como ainda entregando donativos em dinheiro e jóias de ouro para auxiliar o custeio de nossa defesa. Dornas Filho, op. cit., p.146).
14 de março, 2001 ¾ Foram deportados 24 ciganos (oito homens, sete mulheres e nove crianças, uma de colo), para a Romênia. E assim o Brasil mostra quão pouco hospitaleiro é. In Folha de S. Paulo de 14/3/2001.
14 de julho, 2001 ¾ É posto em liberdade o cigano Paulo Bianchi Yvanovich, que fora preso em 19 de abril de 2001 injustamente, e acusado pelo estupro e assassinato de três jovens em Teresópolis. O exame de DNA inocentou o rapaz. O Globo. Rio de Janeiro. Eis aí o velho preconceito: Se há um crime, prenda o cigano.
31 de dezembro, 2001 ¾ Refugiados romenos somem em São Paulo. Assim noticiou a Folha de S. Paulo: (400 indivíduos desaparecem... deportados? Escondidos por alguém? Expulsos da cidade? O consulado da Romênia informou: eles são ciganos e não querem trabalhar. O que aconteceu com esta gente?)
13 de maio, 2002 ¾ Até que enfim! Após 428 anos o governo brasileiro reconhece que os ciganos merecem respeito, são cidadãos. O Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH II) inclui (graças aos esforços da Associação de Preservação da Cultura Cigana, no Paraná), pequeno texto sobre este povo. Vamos citar os tópicos relativos a eles para que não se esqueçam:

Ciganos
259. Promover e proteger os direitos humanos e liberdades fundamentais dos ciganos.
260. Apoiar a realização de estudos e pesquisas sobre a história, cultura e tradições da comunidade cigana.
261. Apoiar projetos educativos que levem em consideração as necessidades especiais das crianças e adolescentes ciganos, bem como estimular a revisão de documentos, dicionários e livros escolares que contenham estereótipos depreciativos com respeito aos ciganos.
262. Apoiar a realização de estudos para a criação de cooperativas de trabalho para ciganos.
263. Estimular e apoiar as municipalidades nas quais se identifica a presença de comunidades ciganas com vistas ao estabelecimento de áreas de acampamento dotadas de infra-estrutura e condições necessárias.
264. Sensibilizar as comunidades ciganas para a necessidade de realizar o registro de nascimento dos filhos, assim como apoiar medidas destinadas a garantir o direito de registro de nascimento gratuito para as crianças ciganas.

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